terça-feira, março 31, 2009

De Curaçao a San Blas

De Curaçao a San Blas:

MuitosGolfinhos
(Fotos por Silvio Ramos e Lilian Monteiro).

Curaçao:

Queria chegar logo a Curaçao, pois meu AIS não estava funcionando, havia comprado alguns itens para entrega na Curaçao Marina por volta do dia 20 de Fevereiro e não conhecia bem o procedimento da Aduana quanto a artigos importados para entrega a barcos em trânsito passando por Curaçao.

Quando cheguei à marina, vi que um dos três pacotes já estava lá, o que continha itens da minha lista de abandono do barco que comprei da LandsFall e os outros dois tive que esperar alguns dias, pois, era Carnaval em Curaçao.

Tinha uma goteira para dentro da mesa de cockpit, onde ficam instalados os equipamentos de navegação do barco e o AIS. Por uma incrível coincidência, instalei o AIS de painel para cima, e a goteira, mesmo que pequena, ficou bem em cima da janela de luzes indicativas, a única parte do AIS que não é a prova d'água! Não deu outra, ele se afogou, não funcionou mais e eu não queria passar pela rota de navios entrando e saindo do Panamá sem um AIS funcionando, então, no dia 23/02, mandei um email para o Norberto, diretor da Cash, de quem havia comprado o meu AIS SRT. Ele somente me respondeu no dia 6/03. Nesse meio tempo comecei a negociar diretamente com a SRT em Londres, mesmo porque, não estava mais no Brasil, território coberto pela Cash, e seria muito difícil para a Cash me dar suporte em Curaçao. No fim, a SRT me deu muita atenção e enviou um AIS novo, que funcionou perfeitamente no meio dos muitos navios que cruzamos na nossa rota para o Panamá, ou seja, um final feliz para eu como consumidor. Mas, durante as negociações, informei a SRT, pois a Cash já sabia, que escrevo sobre minhas experiências com fornecedores e equipamentos e isso causou um mal estar com a Revista Náutica, pois o Norberto disse à eles que eu estava ameaçando-os.  No fim, a diretoria da Náutica resolveu tirar do ar as minhas colunas. Melhor assim; publicadas no meu blog eu não fico com rabo preso ou dependendo de censura para descrever as minhas experiências, pois não quero privar meus leitores do acesso aos relatos.

Isso me custou mais 4 dias em Curaçao para postar no blog pelo menos os relatos referentes à nossa partida, que haviam sido tiradas da Náutica Online. Depois com tempo organizo melhor todas as colunas desde o início.

Nesse meio tempo, aproveitamos para andar um pouco pela cidade e fomos ver os carros alegóricos passarem na Otrabanda, o outro lado da cidade que divide o canal de entrada dos barcos. Para chegar lá, atravessamos a ponte que abre para dar passagem aos barcos e navios. Muito interessante essa ponte. Ela bóia, em uma extremidade tem um motor com hélice que anda para frente ou para trás, e a outra extremidade é presa do outro lado. Quando eles querem abrir a ponte, fecham ela para a passagem de pedestres, e aceleram o hélice que empurra a ponte em um meio circulo. Para fechar, revertem o hélice e a ponte volta para encaixar na parte fixa e vira ponte novamente.

Na terça-feira, quando a marina abriu, pegamos o pacote da LandsFall, conferimos o conteúdo e tudo estava em perfeita ordem. Com ele, montamos o nosso pacote de abandono de barco, se necessário, e esperamos nunca ter que usá-lo, mas, se for preciso, está pronto.

Na quarta-feira chegou o pacote com as placas solares de 130W. Quando estava abrindo, com vários cruzeiristas em volta, um deles notou que haviam pegadas em cima do pacote, e não deu outra, a primeira placa estava completamente quebrada!  Deu um trabalhão, mas a empresa de quem comprei as placas mandou outra a custo deles, pois havia pedido por escrito para eles mandarem com seguro e eles mandaram sem. O problema ficou entre a empresa e a UPS. Foi vandalismo puro, pois haviam quatro marcas de pulos com botas em cima da caixa. De qualquer forma, problema deles. Só tive que esperar mais 4 dias para chegar a placa de reposição. Como comparativo, o problema com o AIS demorou do dia 23/2 até o dia 12/3 para ser resolvido, pois a decisão sobre uma solução tinha que passar pela Cash.
Nessa altura já havia desinstalado as placas de 32W e instalado uma nova de 130W. Logo notamos a diferença na carga das baterias, pois os seis amps que carregavam as três placas de 32W agora já eram 10 amps com uma placa de 32W e uma de 130W.

Quando chegou a terceira placa, em reposição da que havia quebrado, instalei ela também e a carga por placas solares subiu para 18 amps contra os 6 que tinha antes.

Mais alguns dias e chegou o pacote com o DuoGen, o gerador de arrasto que comprei da Ecletic na Inglaterra. Instalei ele também, e pus uma chave de baterias que pode separar as cargas solares das por arrasto, ou deixá-las juntas, para poder ter todas as opções.

Enquanto esperava pelos equipamentos que ainda não haviam chego, fui fazendo outras manutenções no barco. Desmontei o suporte do piloto, aquele que tinha um parafuso falso e que era muito pequeno para o espaço onde foi montado, assim como o parafuso que prende o braço do piloto ao quadrante e mandei fazer um suporte do tamanho certo, mas agora de aço inox, mais uma peça única em inox para prender o braço do piloto ao quadrante. Os dois me custaram US$500, mas agora tenho muito mais confiança de que não vão mais quebrar.

Também desmontei as duas bacias da pia da cozinha que vazavam muito desde novas. O estaleiro havia tentado vedá-las depois delas montadas e não quando estavam encaixando na pia, pois não havia sicaflex entre as bordas das bacias e a pia, somente em volta das bacias por baixo. Aproveitei também para vedar a geladeira, usando espuma expansiva para fechar os espaços em volta dela. Na parte da frente, com um acesso mais fácil, colei duas placas de isopor depois de aplicada a espuma.

Outra manutenção necessária foi a instalação de um calço para não deixar a pia cair. Já havia cedido 1 ½ cm, pois não havia nenhum suporte entre a pia e a parede onde ela fica apoiada.

Também troquei as mangueiras de exaustão de água dos paióis e do piso do cockpit, junto aos lemes, pois eram de qualidade inferior e estavam completamente deterioradas e vazando para dentro do barco.

Colei, agora com araldite, os furos no pescoço de ganso do escapamento, pois mesmo depois de soldados pela segunda vez, continuavam vazando. Agora, o vazamento continua, mas é muito pequeno, e vou remendando de quando em quando com araldite.

Me lembro que quando era para o estaleiro me entregar o barco, pois havia o compromisso de correr a regata de Caras/Revista Náutica, soube que alguns dos componentes feitos fora,  não haviam sido pagos aos fornecedores originais (Nautos, Farol, NorthSails) e tive que pagar eu mesmo para que esses itens fossem entregues e o barco pudesse ficar pronto. Uma conclusão óbvia é a que o estaleiro ficou sem capital de giro e, além de não pagar suas contas, pois já tinham muitos protestos, e começaram a usar produtos de baixa qualidade. Um exemplo são as mangueiras que foram usadas no barco, que vieram de muitos fornecedores diferentes, com algumas de muito baixa qualidade que chegavam a inchar quando se ligava a bomba de água doce. Outro exemplo é a corrente da âncora, que já está completamente enferrujada. Tenho corrente de âncora do meu outro barco a mais de quinze anos, sem qualquer ferrugem, mas a do Matajusi, já manchou a proa inteira de ferrugem. Vou trocar quando puder e adicionar outros 50 metros, pois a que tenho tem somente 50 metros e as ancoragens por aqui e no Pacifico são algumas vezes bem mais profundas.

Outra manutenção necessária foi a de desmontar os equipamentos Raymarine de dentro do paiol de eletricidade, pois os fios estavam completamente encharcados de água salgada! Não consegui encontrar ainda por onde esta entrando água, então forrei com plástico duro os equipamentos, começando por trás, dando a volta por cima e pela frente, até o piso do paiol. Usei o mesmo plástico que uso para cobrir os equipamentos do cockpit, e sequei todos os fios e a água acumulada no piso do paiol.

Mais alguns serviços mal feitos e produtos de baixa qualidade usados pelo estaleiro, resolvidos.

Aproveitei a oportunidade e instalei um equipamento de MOB (Man OverBoard, ou homem ao mar) que consiste de uma pulseira para cada tripulante no deck, que se conecta via rádio com um receptor na cabine, ligado ao sistema SeaTalk da Raymarine. Caso um tripulante se afaste do barco por mais de 30 metros, ou caso ele caia na água, pois nesse caso a pulseira detecta a água, o sistema automaticamente começa um procedimento de MOB na carta e no radar, e soa um alarme de MOB.

Outra novidade foi uma antena para rede sem fio que alcança muito mais longe os sinais, assim podemos fazer internet do próprio barco. Depois de instalar o SW da antena, conecto-a pela entrada de USB do notebook, e a levanto pelo cabo de bandeira de boreste, até o limite do cabo da antena e conseguimos uma recepção muito melhor dessa forma.

Passamos quase um mês em Curaçao, mas não fizemos muito mais do que manutenção no barco. Trabalhei todos os dias em algum projeto do barco. O principal problema que tínhamos era de falta de energia, e isso me forçava a usar muito o motor para carregar as baterias. Com isso consumia muito óleo diesel e adicionava muitas horas no motor, o que causava uma necessidade de manutenção muito mais freqüente, como trocas de óleo e filtros, além de não ser o melhor uso do motor, pois carrego as baterias quase que em marcha lenta, e isso carboniza o motor, causando uma fumaça branca muito intensa quando acelero no RPM correto de uso do motor, que no caso do meu seria 2.600 RPM.

Com a instalação das placas, para dias ensolarados, não precisamos mais ligar o motor, e para as noites, passei a usar o gerador de arrasto, mas isso somente depois que consertei um problema na instalação que não havia percebido até tentar usar o gerador. O problema era que o fio positivo do gerador encostava no soquete que instalei para conectar o lado de fora do barco com o lado de dentro, onde instalei o regulador de voltagem do gerador de arrasto e com isso não passava corrente. Notei o problema na primeira vez que fomos usar o gerador, e o consertei navegando mesmo. A partir daí, praticamente não usamos o motor quando estamos em navegação. Sobrou à noite quando estamos ancorados, pois não podemos usar o de arrasto, e as placas solares não funcionam a noite, então, estou vendo a possibilidade de instalar o outro componente do DuoGen, que funciona com vento. Ele usa o mesmo alternador, mas trocando-se o componente de arrasto em água pelo componente eólico.

Outra consideração é a de se ter um gerador a diesel ou a gasolina. Tentaremos encontrar uma solução no Panamá.

Aha! E não podemos nos esquecer de falar sobre a nossa nova capacidade de mandar e receber email do próprio barco, usando o rádio SSB e o sistema SailMail, que suporta emails por SSB em quase todo o mundo. Primeiro baixei o SW AirMail e todas as instruções do site do SailMail, depois tive que fazer um registro de rádio para o Matajusi. Com o registro, me cadastrei no SailMail e esperei para ser aceito, após isso feito encomendei o modem (US$1500) de St. Marteen, e quando chegou, percebi que seria melhor usar um cabo pronto para conectar o modem com o SSB do que fazer um, então encomendei o cabo (US$60) também de St. Marteen. Depois disso tudo, passei uma semana inteira instalando e tentando fazer funcionar o sistema, como não conseguia conectar, pedi ajuda ao Andre, um holandês que mora em Curaçao e conhece muito sobre rádios SSB. Ele veio ao barco, mexeu no rádio e no notebook, e de primeira, conseguiu conectar! De lá para frente, fui lendo mais e me familiarizando mais com o sistema, e hoje faço emails duas vezes por dia. O sistema tem capacidade de ler e responder emails em outros sistemas, então implementei ao meu SailMail a capacidade de ler e responder emails do Matajusi no Gmail. Muitos emails do Matajusi que respondo hoje são feitos pelo meu email do barco usando Sailmail. Em pouco me tornei um bom conhecedor do SailMail e agora ajudo outros barcos a conectarem seus emails pessoais ao SailMail.

De tudo que queria fazer no barco só ficou faltando um dessalinizador, que pretendo fazer quando estiver no Panamá.

Fizemos a documentação de saída na sexta-feira e o provisionamento do barco no fim de semana, com um pequeno incidente na última visita ao supermercado para comprar últimos itens. Um amigo me levou para um supermercado holandês, de classe mais alta, realmente os produtos eram bons e muito variados, separei o que estava na lista, pus numa daquelas cestinhas de supermercado e fui para o caixa. Pus a cesta na esteira, e quando chegou a minha vez, na frente do caixa, a atendente falou qualquer coisa comigo em holandês. Com um sorriso, respondi em inglês se ela poderia falar em inglês ou espanhol. Ela insistiu em falar algo em holandês. Como não entendi o que falava, respondia em inglês e espanhol. De repente, ela pegou a cesta com meus produtos e sacudiu para cima, jogando todos os produtos na esteira, e continuou batendo a cesta em cima até amassar completamente os dois sacos grandes de fritas que eu havia separado. Olhei para ela, que me olhava com uma expressão do tipo, “e daí?!”, e disse que não apreciava a atitude dela, mas que a ia ajudar um pouco na sua atitude. Peguei a cesta e joguei-a no meio do supermercado, por cima da cabeça dos que estavam na fila. Sem tocar em ninguém, lá ficou a cesta no meio do corredor! Em seguida perguntei ao caixa se ela queria mais ajuda para desmanchar os produtos que havia separado! Ela ficou lá, me olhando com cara de surpresa, e eu pedi que ela fosse trocar os sacos de batata que havia esmagado de propósito.  Ela sumiu, e lá vêm os gorilas da segurança... Perguntaram o que havia se passado e lhes disse o que ela havia feito e como eu havia respondido. Como a coisa começou a ficar mais complicada, com um cliente na fila tomando as dores da atendente e me chamando para conversar “lá fora”, resolvi deixar tudo como estava e sair sem comprar nada. Senti um racismo mais forte do que quando estive na África do Sul na época do Apartheid!  Mas isso foi uma atitude singular da atendente e do cliente e não de todos da ilha.

Na nossa estada em Curaçao, como sempre fizemos muitos amigos relâmpagos. Assim que chegamos conhecemos o Lui e a Janet  do Scapatela de bandeira americana, e como eles tinham um carro alugado, nos levaram para sair algumas vezes. Em troca fizemos um jantar de despedida quando eles partiram. Depois conhecemos o Ric e a Moss, do Sojourner de bandeira americana. Eles primeiro nos convidaram para um vinho com aperitivos no barco deles, e depois os convidamos para uns aperitivos no Matajusi. Outro casal muito simpático e também amigos do Bob e da Cristina do Insuisanse foram os franceses Jean Claude e Monique, do La Fer Verte de bandeira francesa. Com eles também trocamos jantares e eles ainda fizeram uma reunião de despedida nossa no barco deles. Tiveram também o Dan e a Carla, do Alegria de bandeira americana. Por ultimo chegou o Prieto do Tutatis, barco irmão do Matajusi. Ele teve uma operação nas costas que esta dando trabalho e além disso sua filha também foi operada então ele não vai poder dar seguimento à sua viagem esse ano. Ele me ajudou com cartas e GPS para o IPAQ HP 6945 que uso como celular. Mais um GPS a bordo.

A Partida:
Partimos para San Blas no Panamá na segunda-feira, dia 17 de Março as 8h, depois de 24 dias em Curaçao. A previsão era boa e logo montamos todas as velas e alcançamos boa velocidade.  Testei o gerador de arrasto e notei o problema do curto, então refiz toda a instalação com o barco em movimento. Funcionou bem depois do acerto, gerando os catorze amps prometidos a 8 nós. Com isso, só ligamos o motor duas vezes a caminho de San Blas, para virar o barco contra o vento e ajustar a mestra.  Nesse primeiro dia singramos 166 milhas no rumo 295° a uma média de 6.9 milhas/hora, com ventos de popa entre 15 e 30 nós, e mar médio com ondas entre dois e três metros. Em 24 horas, passamos pelas águas territoriais de quatro países, Curaçao, Aruba, Venezuela e Colômbia.  Tivemos muitos navios pelo caminho, e teria sido muito complicado sem o AIS SRT. Chegamos a ter 7 navios em um espaço de 10 milhas, com dois pela proa, três alcançando, um cortando por bombordo e outro por boreste.  Com o uso do AIS, chamei vários navios para sugerir manobras para evitar perigo de colisão. Todos os pilotos responderam aceitando nossas sugestões. O fato deles poderem nos ver no AIS deles ajuda muito, pois o sistema deles não permite navegar em rota de colisão com um outro alvo de AIS.

No segundo dia de navegação, o mar piorou, com ondas mais altas, vento entre 15 e 30 nós, e uma corrente contra que estimei em 1,5 nós. Nesse dia passamos por um apuro quando as velas estavam armadas em asa de pombo, com a mestra presa pelo preventer, nós dois tirando uma soneca e o piloto soltou. O barco atravessou, e de repente, estávamos velejando para trás! Essa não era uma situação que eu conhecia, ou havia previsto, então, muito stress para sair dela. Primeiro ligamos o motor e aceleramos forte, para ganhar de novo o controle do barco. Mas, o vento estava forte, e conseguimos dar uma segunda atravessada.  Enquanto eu tentava manter o controle do barco, a Lilian soltou a adriça da genoa. Pedi para ela controlar o barco e fui para frente para tirar o pau da genoa. Consegui fazer isso e enrolamos a genoa. Depois foi só cuidar da mestra, que aproveitamos para risar mais. Ufa! Que adrenalina! Fiquei uns minutos respirando e revisando tudo que havia se passado. Sentei com a Lilian e discutimos o que fizemos e o que podíamos ter feito.  Acho que poderia ter posto o barco de novo em posição de navegar normalmente, e só depois cuidar das velas, se ainda fosse necessário, pois na hora no perigo, fui logo desmontar as velas. Mas, funcionou e conseguimos dominar o problema. Não quero estar nessa de novo! O barco velejando para trás, pode encher de água muito rápido e afundar. Não sei como não inundamos o cockpit! Nesse dia singramos 130 milhas no rumo 255° com média de 5,4 nós, uma das mais baixas que já fizemos.

O terceiro dia foi mais “punk”, com mar grosso, ondas de até oito metros, ventos entre 20 e 35 nós, muitos navios pelo caminho, corrente contra, mas conseguimos passar o dia sem incidentes. Ao anoitecer, eu estava cansado e estressado, e tinha que tomar a decisão de baixar a mestra e usar somente a genoa, pois ventava forte e o barco estava voando só de mestra no terceiro riso. Tínhamos 3 opções: virar o barco de frente para o vento e as ondas, e elas estavam altas, no piloto automático; deixar a Lilian controlando o barco e eu ir abaixar a mestra; ou eu controlando o barco e a Lilian ir abaixar a mestra. Acho que fiquei uma boa hora considerando os prós e contra de cada opção, até que a Lilian se ofereceu para ir abaixar a mestra. Demorei a concordar, mas entendi que essa era realmente a melhor opção, pois seria muito mais fácil para eu controlar o barco naquelas condições do que a Lilian. Pedi para ela vestir o colete, se amarrar no cabo de vida, levar uma lanterna de cabeça, e se abaixar quando eu falasse, pois as ondas estavam realmente altas e potentes. Fizemos tudo sem incidentes, armamos a genoa e fomos em frente noite adentro.

No nosso quarto dia de travessia, estávamos os dois muito cansados então deixamos o Jarbas, nosso piloto automático trabalhar forçado. Ele se comportou bem, mesmo com as horas extras. Nosso rumo nos punha meio de través com as ondas e o borrifo molhava tudo por perto.  Isso fora a chuva de peixes voadores que batiam contra o casco e dentro do cockpit. Um me acertou de cheio no peito! Já soube de caso do peixe entrar dentro da boca de cruzeiristas! À medida que eles iam caindo dentro do barco, íamos jogando-os de volta ao mar.

Singramos 139 milhas nesse ultimo dia, com média de 5,8 milhas/hora. Os ventos eram de 15 a 25 nós, de aleta de boreste, e o mar era médio com ondas até 4 metros.  Avistamos as primeiras iolhas de San Blas por volta das 10 horas, e nos preparamos para entrar pelo canal do holandês, para dentro do abrigo do Cayo Holandês.

Soubemos depois que essa travessia entre Curaçao e San Blas é considerada a quinta travessia mais difícil em todo o mundo. Não foi a toa que o mar estava fervendo!

Na próxima coluna vou relatar mais das nossas aventuras no Panamá.

Convido meus leitores a se comunicarem comigo pelo e-mail matajusi@gmail.com, e a acompanharem notícias sobre o Matajusi no site do projeto, www.matajusi.blogspot.com<http://www.matajusi.blogspot.com>.

Se quiserem receber automaticamente informação sobre novas colunas online, registrem seu e-mail no FeedBlitz, pelo link, <http://www.feedblitz.com/f/?Sub=449533>

sábado, março 14, 2009

Fauna em Tobago


Fazendo compras em Tobago



Tatiana em Tobago

Piratas?

De Tobago a Curacao - Texto:

Tobago a Curaçao
(Fotos por Silvio Ramos, Tatiana Ramos e Lilian Monteiro).

Tobago:
Saímos de Tobago as 8:30 horas e de cara pegamos ventos fortes e ondas altas e a Tatiana já começou a passar mal. Para piorar as coisas, esqueci de fechar a tampa do paiol de âncora, e ele encheu na primeira caturrada. Logo percebi a burrada e fui fechar no meio das caturradas fortes. Depois de algumas imersões junto com a proa, consegui fechar, mas, soubemos logo em seguida, que o estrago já estava feito, pois vazou muita água para dentro da cabine de proa. Cama, lençóis, travesseiros, velas, capas de velas, tudo ensopadinho. Está certo que eu não devia deixar a tampa aberta, mas a água não devia ter passagem para dentro do barco. Mais um serviço porco da turma da ILS! Enquanto a Lilian se pôs a retirar as coisas molhadas e secar a cabine, eu fui tocando o barco sozinho, com água passando por cima do convés.

Em um espaço de menos de 2 horas, a Tatiana vomitou umas cinco vezes, e fiquei muito preocupado com uma desidratação, então fiz uma parada não planejada na Milford Bay, a ponta sul da ilha de Tobago, onde aproveitamos para secar bem a cabine de proa.

Lembrei que tinha pedido para o estaleiro fazer um tanque de água doce na proa do barco, e que tinha ficado uma mangueira de lá até debaixo da pia da cozinha, onde era para ter uma bica de água doce, mas eles nunca finalizaram esse tanque. Aproveitei e conectei essa mangueira na bomba de porão para sugar a água de debaixo da cama. Havia impermeabilizado aquela área do barco exatamente para o caso de, se vazasse algo por lá, que não fosse para o resto do barco, pois lá fica o tanque de água negra do barco, e agora vi que a decisão tinha sido acertada, pois a água ficou retida debaixo da cama.

Ficamos umas duas horas parados por lá, para que o Dramin que demos a Tatiana fizesse efeito, aí seguimos para Los Testigos.

Algumas horas depois, a Tatiana continuava vomitando a cada meia hora, então propus que fossemos para Trinidad e que ela abortasse a viagem, pois estava muito impressionada com o tamanho do mar e com as histórias de piratas que havia ouvido. Ela concordou, e foi o que faltava para ela pegar no sono, na cama que montamos no centro do barco. Fomos medicando-a a cada quatro horas, e quando acordou, já estávamos ancorados em Los Testigos! Foi uma mentirinha, mas funcionou!

Durante a viagem, deixamos duas gaiutas abertas do lado de sota, uma na sala e uma na cozinha, pois a Tatiana estava dormindo na sala, e em uma das ondas altas, o barco deslizou pela onda e deu de lado no fundo da onda, e encheu a sala e a cozinha de água salgada. Eu sei, eu sei, não andar com gaiutas abertas, mas, parecia que pela sota não tinha problema, até que teve. A Lilian estava possessa de ter que enxugar o barco de novo, mas faz parte da aventura.

Los Testigos:

Chegamos em Los Testigos pelo Norte, mas ainda sem luz do dia, então diminuí a velocidade para procurarmos um lugar para ancorar já com luz. Após 22 horas navegando, ancoramos na primeira enseada abrigada, depois da praia dupla, com mar dos dois lados. Singramos 141 milhas pelo rumo 288°, com ventos nordeste entre 20 e 25 nós e média de 8.1 nós.

Logo que joguei a âncora, o Insouciance, um barco com bandeira brasileira veio ancorar do nosso lado. Ele havia chego à noite e ancorado em frente à praia, mas tinha escolhido um lugar com muita corrente e ficou desconfortável, então, levantou âncora para ancorar do nosso lado. Falamos um pouco e fui dormir. Lembro que ele me disse qualquer coisa sobre ter sido atacado por piratas, mas estava cansado e resolvi checar a história depois que dormisse um pouco.

Quando acordamos, soube pela Tatiana que a guarda costeira tinha vindo pedir a documentação do barco, mas disseram que voltariam à tarde. Foi aí que ela soube que não estava em Trinidad, mas sim em Los Testigos! Ficou um pouco preocupada, mas com todas as nossas aventuras pela ilha, logo esqueceu.

A ilha me surpreendeu pela simpatia dos moradores e da guarda costeira. Logo pela manhã, fomos à praia para andar e exercitar um pouco, e conhecemos o Felix, filho do JonJon (ou algo parecido), um dos membros da família que povoou a ilha a muitos anos atrás. Foi amizade a primeira vista! Falamos de mergulhos e pescarias e ele logo me convidou para ir dar um mergulho para pescar lagostas. Voltei para o barco e peguei meu equipamento de mergulho. Ele veio me buscar com seu barco, e trouxe somente uma máscara, um pé de pato, e um laço, parecido com aqueles de pegar cobras. Fomos mergulhar em um dos lugares de lagostas e ele pegou uma com seu laço, logo no primeiro mergulho! Fiquei ajudando a procurar lagostas e logo vi uma, que apontei para ele. Fiquei observando como funcionava aquilo. Ele enfia o laço por trás da lagosta, sem tocar nela. Quando ela sente o laço, ela chicoteia para trás, e é quando ela própria se enlaça! Pegamos 3 em pouco tempo e voltamos ao Matajusi.

Enquanto preparava as lagostas, o Felix foi fazer algo, mas voltou mais tarde para nos levar até o posto da guarda costeira para fazer a documentação do barco. Lá, fui atendido pelo Sargento Jaques, que me tratou muito cordialmente. Depois o Felix me disse que dava cabras, peixes e lagostas para alguns deles para mantê-los amigos! De lá, o Felix nos levou para as dunas e para a praia das tartarugas, onde elas botam os ovos, mas saímos logo, pois ele disse que o lugar tem fantasmas! À noite, ele veio para o Matajusi com seu violão de quatro cordas, parecido com um cavaquinho e ficamos até tarde tocando e cantando. Ele cantou muitas músicas, a Tatiana cantou algumas e eu toquei flauta o tempo todo. Que delícia! Era tudo que eu sonhava fazer nessa viagem! Depois que se foi, combinamos um mergulho para o dia seguinte, e eu fui fazer um laço igual ao dele para experimentar.

Resolvi ficar mais alguns dias por Los Testigos, e no dia seguinte fomos mergulhar de novo. Dessa vez em um lugar mais aberto, com ondas altas estourando sobre a gente. Só vi uma lagosta e estava muito para dentro de um coral, então voltei pagão, contra as oito que o Felix pegou! Acho que ele sentiu pena de mim, pois me levou para um lugar mais calmo e ficou esperando enquanto eu pegava minha primeira lagosta no laço.

No final da tarde, ancorei o Matajusi do lado do Insouciance, o barco dos brasileiros, para fazer-lhes uma visita, tripulantes de outros 3 barcos resolveram fazer o mesmo, o que virou um luau e dos bons, com vinho, cerveja, sopa quentinha feita pela Cristina e muita música, pois o Felix apareceu mais tarde com seus violões, cantamos e tocamos muito. Aproveitei para saber um pouco mais do que tinha acontecido com eles, e soube que eles haviam sido assaltados por piratas na Laguna Grande há alguns dias atrás, e que os bandidos haviam dado quatro tiros no Bob, e nenhum acertou. Eles me mostraram os furos das balas, uma no encosto do sofá da sala, e outro no teto do cockpit. O Bob disse que saiu xingando os bandidos no meio dos tiros, que achou que eram de estopim, e que tinham cinco bandidos envolvidos: dois no seu botinho, tentando cortar os cabos e cadeados; dois no cockpit, com um já dentro da sala; e um no barco de espera. Ele teve muita sorte dessa vez! A Cristina tem 50 anos e é terapeuta. O Bob tem 60 e é empresário. Eles mantêm um blog do barco deles (http://www.velejandocomavida.blogspot.com/) e devem postar mais detalhes sobre esse assalto que sofreram, além de fotos do nosso luau.

No final do luau, nos despedimos e fomos dormir, pois a idéia era sair as 6 da manhã, mas acabamos acordando mais tarde e assim deu tempo do Felix vir se despedir da gente.

Na saída, deu alguma pane no piloto, que não queria engajar e dava a mensagem NO RUD REF, o que acreditava ser, sem referência do leme. Desci para o submundo, fucei em tudo e não vi nada errado. Desliguei os equipamentos e comecei a fazer duas voltas de dois minutos cada, ligando os equipamentos de novo logo após o início das voltas. Segundo o William da Marine Express, isso sinaliza ao sistema para resetar. Não sei se foi isso que acertou o que estava errado, mas o piloto voltou a funcionar.

La Blanquilha:

Partimos para La Blanquilha às 9:50 horas e chegamos na vila dos militares de La Blanquilha às 22:30 horas, singrando 96 milhas numa media de 7 nós, com ventos nordeste entre 8 e 15 nós e ondas entre 1 e 3 metros. Como já era noite e o radar desmentia o que a carta dizia, resolvi ancorar na praia dos dois coqueiros no final da ilha. Eram 23:30 quando finalmente ancorei entre os dois veleiros que lá estavam.

Acordamos no dia seguinte com o rinchar dos burros selvagens que por lá abundam. Preparei o botinho para a Tatiana e a Lilian irem à praia a remo e eu fui a nado para me exercitar um pouco. Passamos o dia explorando o lugar. Atrás dos dois coqueiros existe uma laguna, que estava seca, e caminhamos por ela até o fim, quando demos em um túmulo com muitas oferendas, e algumas recentes. Fotografamos o lugar e continuamos a explorar, encontrando lagartos, iguanas, e pássaros, alguns conhecidos e outros não. Enquanto a Lilian e a Tati caminhavam pela praia, fui fazer um mergulho nos corais logo em frente, e vi um dos peixes mais bonitos que jamais tinha visto! Era um tipo de frade, mas de múltiplos tons de lilás. Vi também um olhête de bom tamanho e fiquei brincando de esconde-esconde com ele por um bom tempo. Eu chegava mais perto, ele se escondia, eu o achava e ele saia para se esconder de novo. No caminho de volta para o barco, dei com uma barracuda das grandes bem em baixo do barco. Fui descansar um pouco, pois íamos passar a noite velejando para Los Roques.

Los Roques:

As 16:00 horas levantei, preparamos o barco para a velejada e partimos. Seguimos com ventos entre 8 e 28 nós e mar calmo, pelo rumo 289°, pelas primeiras 84 milhas das 115 que tínhamos que percorrer, para nos desviarmos de La Orquija, uma ilha militar com acesso restrito. Depois seguimos pelo rumo 260° pelas próximas 34 milhas, até a entrada da passagem interna entre os corais e baixios de Los Roques. Com ventos fracos e mar calmo, seguimos entre 6 e 7 nós, e eu aproveitei para dormir um pouco, pois eram perto das 9 horas e meu turno tinha começado às 4 horas da manhã.

O barco estava com todo o pano em cima, e acordei com umas gotas na cara. Olhei para trás e não gostei do que vi! Vinha uma chuva forte com carneirinhos já bem próximos de nós. Pulei para começar a reduzir velas, mas já era tarde. O vento e a chuva nos pegaram e demos uma atravessada das boas. Completei a atravessada na mão, e fui de cara para o vento, assim pudemos baixar a mestra e ajustar a genoa. Voltei nossa rota, mas agora já com a arrebentação bem próxima. Os restos de um navio lembram os danos que erros podem causar.

Com a chuva grossa e sem visibilidade, segurei um pouco fora da entrada, e foi o bastante para perceber que a carta estava MUITO errada, pois onde dizia que estaria o farol com a entrada, era pura arrebentação. Fui descendo a costa devagar, até achar o que parecia ser a entrada, e percebi um catamarã ancorado do lado de dentro. Fui devagarzinho procurando pela área mais funda e entrei. Ancorei do lado do catamarã e o chamei no rádio. Ele me disse que tinha ancorado para esperar passar a chuva grossa e ter melhor visibilidade, pois a sua carta também estava muito fora.

Assim que completei a manobra de ancoragem e entrei no barco, percebi o catamarã saindo com um cara no mastro, de pé na cruzeta. Sai correndo de novo e fui levantar ancora para seguir o cara, pois o que eu tinha como referência não batia com o que eu via. Tinha uma foto do guia da Venezuela, dado pelo Bob do Insouciance, e a rota que o catamarã estava seguindo não parecia a correta, então, segui pela rota que achava ser a correta e ... não deu outra, eles estavam na rota certa e eu, em um lugar que não batia com as cartas, então eu não sabia se dava para prosseguir por lá, ou se devia voltar e dar a volta por onde o catamarã tinha prosseguido. Resolvi seguir em frente, mas sempre lembrando das palavras do Marçal Ceccon, se não fizer a coisa certa, mais cedo ou mais tarde vai acabar pagando por isso. Pedi para a Tatiana ir à proa apontando possíveis recifes, e fui dirigindo o barco pelas áreas mais profundas daquele canal. Por sorte, lá na frente tinha uma saída para o canal principal, que peguei e segui até a cidade de Los Roques na ilha de Gran Roque, com umas montanhas de pedra altas e um farol novo e um velho lá em cima.

Ancorei na faixa dos 3 metros, na frente da cidade e nos preparamos para ir de bote conhecer o lugar. Los Roques tem agora uns 1500 habitantes, e está repleto de pousadas, um aspecto bem diferente do que o Marçal deve ter visto quando por aqui passou. Escolhemos o restaurante El Canto de Las Ballenas para jantar, ao preço de US$45 por cabeça, meio carinho, mas conhecido como o melhor restaurante de Gran Roque, o que é verdade; vamos comemorar a vinda da Tatiana ao barco. Fomos muito bem servidos, e conversamos muito com a Nelly, dona do restaurante, e com seu filho Arjuna, que me deu umas dicas de mergulho pelo local. A Nelly se propôs a nos ensinar a fazer pães na manhã seguinte, e quando ela soube que a Tatiana era cantora/compositora e que tinha CDs gravados, nos convidou para tomar café da manhã de graça em troca de um CD, o que aceitamos com prazer.
De manhã, acordamos com um barulho enorme de pássaros e muito movimento na água. Sai para ver e fiquei impressionado com o número de gaivotas e pelicanos mergulhando em volta do barco. Me lembrou do filme “Pássaros”! Também vi um cardume enorme de peixes de bom tamanho, acima de 30 cm, mariscando a tona d’ água. Os peixes traziam os cardumes de pequenos peixes para a tona para cercá-los, e os pássaros mergulhavam para pegar a sua parte.

Novo lugar, novas amizades relâmpago, e ficamos muito amigos do pessoal da pousada da Nelly. Depois de um bom papo, ela nos convidou para um arroz marisqueira que iam fazer, e acabamos ficando o dia todo por lá, aproveitando para usar a internet pela rede sem fio que eles tinham. Depois do café, elogiamos o pão caseiro e logo a Nelly nos convidou para fazer alguns pães. Passamos a manhã fazendo pães!

Comprei um guia dos peixes de Los Roques, um trabalho magnífico feito por uns locais, que é vendido por 45 bolívares (5 bolivars = 1 US$) no Imparques. Tinha visto o livro em uma loja, e estava pagando 120 bolivares por ele, mas como era o ultimo, o cara não pode vender. Acabei economizando 75 bolivares!

Depois do arroz marisqueira, que era um tipo de risoto de frutos do mar que incluía lagosta, ovas de peixe, peixe, mariscos, e pelo menos dois tipos de caramujos locais, fomos escalar a montanha rochosa atrás da cidade e visitar o farol antigo. A Tatiana estava adorando o arroz, até o Arjuna dizer que tinha caramujos! Ela repetiu, Snails? Eu confirmei, e foi a última garfada dela! Mas, estava delicioso! Subimos a montanha e visitamos o farol antigo, já em estado de ruínas, com o interior todo desabado. Voltamos à pousada para nos despedirmos e fomos para o barco, para zarpar na manhã seguinte e conhecer Carenero, onde vive o Paím, um pescador local que eu queria conhecer. Ventou muito forte durante a noite, e de manha, quando saímos, o vento continuava forte. Decidi ir por fora para Carenero, mas a coisa apertou e entrei por uma área que havia estudado pelo Google, onde parecia ter uma baiazinha bem segura. Achei a baia e entrei devagar, mas a profundidade nunca ficou menor do que 2 metros abaixo da quilha. Ancorei na ancoragem mais linda onde já vi o Matajusi, um lugar pequeno e lindo, lotado de conchas, com peixes pulando e pássaros mergulhando por todos os lados, e logo fui dar uma mergulhada. Voltei em pouco tempo com duas sororocas e um olhete de bom tamanho, o que não demorou muito para virar um bom e repleto sashimi a bordo. Com os ossos e cabeças, fiz um pirão para reforçar o almoço. Ficou uma delicia!

Fui mergulhar com a Lilian para mostrar o lugar que eu tinha ido pescar, pois era completamente repleto de todos os tipos de peixes. Ficamos por ali uma meia hora, e tiramos fotos submarinas com a câmera que minha filha me trouxe de presente. É uma Olimpus 1030W, a prova d’água (10m) e contra choque. Encontrei uma lagosta e tirei umas fotos, mas deixei ela por lá. Na volta para o botinho, vi uma vieira das pedras, uma concha saborosíssima que poucos conhecem, então peguei e fui procurar outras. Acabei encontrando umas seis delas e levei para o barco para comermos crua.


Dormimos meio cobertos do vento forte pela vegetação da ilha, e acordamos às 8 horas para sair para Las Aves às 9 horas. Teríamos umas nove horas de navegação para chegar a Las Aves de Sota ainda com luz do dia, para possibilitar uma ancoragem segura, mas acabamos indo mais rápido, com ventos entre 10 e 25 nós, vindos de popa e todo pano em cima, com genoa armada em asa de pombo.

Las Aves:

Percorremos as quase 60 milhas em 7 horas e meia, chegando a Las Aves de Sota as 17:30 horas. Na passagem pela Las Aves de Barla, para meu desconforto, um pesqueiro ficou mais perto da gente do que precisava, fazendo manobras sem nexo na nossa proa. Ele mostrou que andava mais que o Matajusi. Assim, decidi pegar vento de través e cruzar para o norte, entrando na ilha de sota pelo norte. Rapidinho estávamos lá e escolhi a segunda ilha para ancorar junto com dois outros veleiros que por ali já estavam. Ancorei em 3,5 metros de profundidade e dei uns 30 metros de corrente para evitar os solavancos, e funcionou relativamente bem. Acordamos com chuva, mas fomos assim mesmo para a praia de botinho. As ondas estouravam forte na praia e procurei o melhor lugar para desembarcarmos. Achei um na ponta sul da ilha e logo carregamos o bote para cima da duna de areia. Percorremos a ilha inteira pela costa, e vimos muitas conchas daquelas grandes. Todas tem um furo no mesmo lugar, acredito que quem ou o que faça esses furos tem a manha de cortar a lesma pelo lado de dentro para poder soltá-la e comê-la, mas deve ser algo com dentes muito fortes, ou algum tipo de ácido que dissolva a concha. Vimos milhares dessas conchas, mas somente uma viva. Pelo menos sabemos que restou uma!

Como tínhamos que estar em Curaçao no dia seguinte, pois a Tatiana voa as 15:30 de volta para os EEUU, saímos as 19:00 do dia 20 de Fevereiro para Curaçao. Com ventos diretos de popa, sai da área de ancoragem e fui para uma área mais funda para girar o barco de frente para o vento e levantar a mestra. Quando fizemos isso, e virei de novo o barco para o vento, prestei atenção em outras coisa e deixei o barco girar virar demais, provocando um jibe da mestra. Por uma infeliz coincidência, no mesmo segundo que eu fui voltar a vela para bombordo, a Lilian foi tentar ajustar a escôta da mestra, mas por baixo da linha que a escôta faz quando a vela vira de lado, então, com o jibe de retorno da vela, a escôta pegou na cabeça dela, empurrando ela contra a parede lateral do cockpit, e, bela cacetada com a boca no cockpit! Não chegou a abrir, mas seu lábio ficou bem roxo e com sangue pisado. Até agora, não parece que nenhum dente foi afetado pela batida, mas vamos ficar de olho. A velejada até Curaçao estava estimada em 11:30 com pouca vela e media de 6,30 nós, mas, mesmo sem genoa e com mestra risada no segundo riso e ainda fechada para o vento, andávamos a mais de sete nós. Passamos por Bonaire toda iluminada a noite, e seguimos para Curaçao.

Tinha posto um anel de proteção ao barco no radar, e acordei quando o alarme tocou. Olhei e achei que tinha chuva pela frente a bombordo, mas mesmo assim fui conferir a carta, e, surpresa! Tinha uma ilha no caminho! Como pode acontecer isso? Eu tinha conferido essa rotas muitas vezes. O que aconteceu é que, juntei a rota de Aves a Bonaire com a de Bonaire a Curaçao, pois não tínhamos tempo de parar em Bonaire, e tive que deletar alguns waypoints, mas não conferi no detalhe em zoom a rota editada, e, dito e feito, não vi uma ilha no caminho!

Depois da ilha, que a Lilian pensou ser uma rede, apontei o barco para o farol da ponta de Curaçao, e por lá seguimos. Assim que dobrei a ponta, vi algo no radar, mas nenhuma luz que fosse com aquilo. Fiquei de olho, e reconheci que era algo em movimento, mas sem luzes de navegação. Consegui distinguir algo se aproximando a olho nu, e a mancha foi crescendo no radar. Quando ficamos de través, liguei um holofote forte que tenho e apontei para aquilo, que logo reconheci como um navio de guerra! Eles responderam com um holofote mais forte do que o meu, e dei dois sinais de luz, querendo dizer, OK, entendi, não ilumine um navio de guerra! Diminui um pouco a velocidade para chegar à entrada do porto com luz do dia, e quando o dia chegou, fui entrando entre Panda e Outrabanda, as duas zonas da cidade de Williamstadt separadas por esse canal de água. Logo na entrada tem uma ponte de pedestres, e chamei pelo radio a Bridge Control para ter uma idéia de quando eles iam abrir a ponte. Eles responderam que entre quinze e vinte minutos, e esperamos por ali, já dentro do canal e próximos a ponte. Em menos do que quinze minutos, eles começaram a abrir a ponte, que abre de lado! Eles navegam com um lado da ponte canal a dentro, com o outro lado preso, então vão entortando a ponte para abrir um espaço e deixar os barcos entrarem.

Bom, chegamos a Curaçao. Navegamos a motor canal a dentro, e não paramos na imigração ou customs. Fomos direto para a Curaçao Marine. Ainda bem que encontrei um velejador suíço com sua esposa em Los Aves de Sota e ele me deu algumas dicas da chegada até a marina, pois tem uns lugares muito rasos que não estão nas cartas.

Chegamos à marina, atracamos o barco e fomos conhecer o lugar. Logo encontramos o Julio, que esta reformando o barco por lá, que nos deu muitas dicas sobre o lugar. Ele disse que tínhamos que voltar para o canal e fazer a imigração e customs. Então pegamos o botinho e fomos de botinho. Com o vento forte, e um botinho que realmente não foi feito para essas aventuras, nos molhamos bastante e, quando chegamos ao lugar que o Julio tinha nos dado, o píer era alto e estava lotado de óleo por todos os lados! Foi um trabalhão desembarcar a Tatiana e a Lilian sem se sujarem de óleo! Mas, consegui, achamos a imigração, fizemos os papeis, tudo muito simples e cordial, e fomos para o Customs, do outro lado do canal. Lá puxamos o botinho para cima da calçada da cidade, imaginem a cena, com todos olhando! E isso, do lado do Nirvana, um super yacth espanhol de mais de 100 pés. Bom, fizemos Customs, sem problemas e voltei ao barco de botinho, mandando a Tati e a Lilian de táxi (US$15).

A Tati preparou as malas, e fomos para o aeroporto. Depois de uma fila enorme, ela embarcou, e um pedaço de mim foi junto com ela. Foi ótima a estada dela no barco. E até que ela e a Lilian não se pegaram muitas vezes! Mas adorei tê-la a bordo, e ela gostou muito também, então, vamos esperar por mais oportunidades dela se juntar a nós pelo caminho.

Na próxima coluna vou relatar mais da nossa vida em Curaçao.

Convido meus leitores a se comunicarem comigo pelo e-mail matajusi@gmail.com.

Se quiserem receber automaticamente informação sobre novas colunas online, registrem seu e-mail no FeedBlitz, pelo link, http://www.feedblitz.com/f/?Sub=449533

De Ilhas de Salut a Tobago - Texto:




Ilês Du Salut a Tobago
(Fotos por Silvio Ramos e Lilian Monteiro).

No dia 29/01, depois de almoçar no barco, fomos passear na Ilha Royale, parte do arquipélago de Salut e demos a volta inteira na ilha por uma trilha parando algumas vezes para comer um côco, olhar a fauna ou mesmo alguma ruína que não tínhamos visto antes. Fomos na tal da piscina, que nada mais é do que um cercado de pedras por onde entra a água da maré alta, enchendo esse cercado, criando uma piscina de água salgada. Mas ela é muito rasa e só dá mesmo para se refrescar um pouco. Colhemos alguns côcos para comer no barco e ficamos surpresos ao ver bandos de macacos. Tinham dois tipos, um maior e mais arisco, e um menor bem mansinho. Esses vieram comer barra de cereal Nutry da minha mão, e um deles segurava meu dedo com uma mão e pegava a comida que eu oferecia com a outra, como um sinal de amizade e agradecimento pela oferta de comida. No final da tarde retornamos ao barco para descansar e nos prepararmos para a saída com destino a Tobago no dia seguinte. Choveu bastante e aproveitamos para tomar banho de chuva e lavar algumas roupas.

No dia 30, as 11:00h, levantamos ancora e saímos na direção de Tobago. Os ventos estavam de Nordeste, entre 20 e 30 nós, com ondas espaçadas entre 1 e 3 metros de altura, e logo pegamos boa velocidade. Fiz uma linha reta entre Salut e Tobago e por ali seguimos pela rota mais curta, até conseguirmos falar com nosso anjo da comunicação, o Fernando, que nos pôs em contato com o Dadi, que tem um Troller e está dando a volta ao mundo também. O que ouvi dele me deixou um pouco apreensivo, pois me contou que exatamente naquela rota, ele havia sido atacado por piratas que tentaram abalroar seu barco. Gostei muito de falar com ele, principalmente pela experiência dele, mas confesso que queria sair logo do rádio e mudar minha rota, o que fiz logo em seguida. Abri um pouco mais para não passar por perto do Suriname. Daí para a frente, por 3 dias, ficamos muito tensos todas as noites. Passamos a navegar no escuro, sem luzes a bordo, e evitando qualquer barco aceso que estivesse pelo caminho. Tentava passar a um mínimo de 6 milhas deles. Coincidentemente, a rota em linha reta entre Salut e Tobago, estava cheia de pesqueiros, como se fosse uma rede que um barco navegando entre esses dois pontos tivesse que obrigatoriamente passar. Outra coincidência aparente é que a outra “rede” de pesqueiros ficava exatamente na rota em linha reta de Natal para Tobago! Coincidência ou não, passamos a noite desviando dos pesqueiros, no escuro.

Já cedo na manhã seguinte, de guarda baixa, demos de frente com um pesqueiro sozinho, que imediatamente após nos ver, acelerou tudo, daquelas de sair fogo pela chaminé, tentando interceptar a nossa rota. Eu que estava com as velas risadas para a velejada noturna, sai correndo para tirar o riso da mestra e soltar toda a genoa. Tínhamos bom vento, e além disso, liguei o motor e acelerei médio. O pesqueiro respondeu acelerando mais e subindo um pouco sua rota para continuar em rota de intercepção conosco. Com a adrenalina subindo alto, acelerei tudo e desviei 20 graus mais para baixo, tentando me afastar da rota dele. Ele foi chegando cada vez mais próximo, não deixando dúvidas sobre sua intenção de interceptar a gente. Pedi para a Lilian ir tirando fotos e nos preparamos para a defesa do barco. Percebi que, com vento e motor, tinha um pouco mais de velocidade que ele, e prossegui na mesma tática. Quando ele estava a uns 200 metros do Matajusi, guinei rápido na direção dele, pois aí peguei ventos em orça que aumentaram ainda mais minha velocidade, e passei pela sua proa a toda. Ele desacelerou, desistindo da perseguição que seria inútil, pois tínhamos bem mais velocidade e agilidade de movimento que ele.

Ufa!!! O corpo todo tremendo na expectativa da confusão, a adrenalina correndo solta, e seguimos em frente, contentes de termos evitado o que parecia um problema bem grande para se resolver.

Seguimos assim do mesmo jeito, agora com todo o pano em cima, navegando entre 8 e 10 nós. As 11:00 da manhã, quando completamos as primeiras 24 horas dessa perna e fomos registrar os dados da perna, notamos que havíamos singrado 207 minhas, a uma velocidade média de 8.6 nós! Nossa, acho que devíamos adicionar uns piratas nas nossas regatas, assim íamos quase conseguir andar na mesma velocidade do barco fita azul da Refeno!

Para os mais interessados e precavidos, a posição do encontro com o barco com intenções obscuras e possivelmente mal interpretadas por nós, foi 07.31.325N e 054.58.626W, no través no Rio Coppename no Suriname.

Na conversa com Fernando pelo rádio, soubemos que a Tatiana, minha filha, estava confirmada para chegar no dia 7, e ia trazer mais antenas, além de algumas cópias da revista Náutica para irmos divulgando pelo caminho. Fomos dando revistas de presente por onde passamos e acabamos sem nenhuma no barco.

Já no nosso segundo dia dessa perna, os ventos caíram bastante, ficando desde sem vento até uns 10 nós no máximo, e fomos ajudando com o motor, pois queríamos nos ver livres da costa do Suriname que parecia ter grudado no nosso través, pois não saímos do lugar! Percebi uma corrente entre 2 e 3 nós contrária, e não conseguíamos mais que 6.5 nós, mesmo ajudando no motor.

Comecei a pensar como seria a noite se tivéssemos que fugir de algum cerco novamente! Não sei se a conversa com o Dadi me deixou impressionado, mas dali para a frente tudo que víamos no mar se parecia com piratas, e não deu outra! A noite, por volta das 23:00h, percebemos dois pesqueiros grandes a umas 12 milhas, por boreste. Já desviei para bombordo uns 10 graus, e fomos nesse rumo, até perceber que o primeiro pesqueiro não saia dos meus 45 graus, em rota de colisão, ou seria de interceptação?! Ajudei no motor e ajustei melhor as velas, mas continuamos com os 45 graus dele. Fomos assim até umas 2 milhas de distância um do outro, quando resolvi acelerar tudo. Os 45 graus de rota de colisão continuaram! Com o barco todo apagado, e somente o radar funcionando, começamos novamente a nos preparar para uma abordagem pirata, pois esse barco era grande e muito mais rápido que o Matajusi.

Mantive esse mesmo rumo, andando entre 8 e 9 nós, até uns 500 metros do outro barco. Então dei uma guinada rápida de 90 graus, passando ele para os 45 graus de bombordo. Ele acelerou e veio de novo em rota de colisão conosco. Aí resolvi apagar o radar, pois achei que ele estava “me vendo” pelo meu radar, usando um interceptador de ondas de radar. Isso parece ter dado certo, e já bem próximo, dei mais uma guinada de 90 graus a bombordo, deixando ele a meus 45 graus de boreste. Ele desacelerou e passamos pela sua popa.

Ufa de novo!!! Não queria mais estar por ali, preferia estar no Sitio Forte, ou no Abraão em águas calmas!

Não consegui deixar de pensar que ainda tinha mais um pesqueiro na nossa frente, e que agora, havia ficado entre os dois, e que eram barcos bem maiores que o meu e andavam muito mais rápido, então, mantive uma distância grande do próximo pesqueiro, com o motor no máximo e todo o pano em cima e bem ajustado. Passamos pela popa do segundo pesqueiro sem maiores incidentes, e fiquei a pensar se o que parecia ser pirataria não seriam pescadores defendendo suas redes na água, interceptando nosso rumo como fizeram. Bom, antes seguros do que arrependidos. Será que usamos toda a dose de adrenalina que nosso corpo consegue produzir? Tomara, pois mais uma dessas e vou surtar!

No final das segundas 24 horas navegadas, havíamos singrado 148 milhas com uma média de 6.6 nós, ventos de leste/nordeste entre 5 e 30 nós, seguindo pelo rumo 318°, com nossa media de uso do motor continuando perto das 7 horas/dia.

No nosso terceiro dia nessa perna, parecia mesmo que nunca íamos consegui nos safar da costa do Suriname, singrando 145 milhas em uma média de 6.0 nós e ventos variando entre leste e nordeste de 8 a 30 nós, nos forçando a ajustar as velas muitas vezes durante esse dia. Depois de dois problemas com arranjos mais elaborados das velas, aprendemos a esperar um pouco mais antes de mudar o arranjo, pois, com ventos de popa de 5 nós, decidimos montar o genaker, apenas para termos ventos de través de 25 nós logo após conseguirmos a façanha de acertar a montagem dessa vela. Quase arrebenta e chegamos perto de conseguir nosso primeiro jibe chinês!

Outra hora, novamente com ventos fracos de popa, fui montar sozinho uma asa de pombo, e assim que consegui, de novo os ventos mudaram para 25 nós de través, e a coisa ficou feia por aqui! Estava querendo mostrar para a Lilian que eu podia fazer essas coisas sozinho, mas tive que engolir um sapinho que estava na garganta e pedir para ela vir me ajudar e desmontar a asa de pombo e passar a genoa de novo para o outro bordo. È assim mesmo, vamos aprendendo com nossas novas experiências.

Estávamos agora a menos de 24 horas de Tobago, e tentei fazer um arranjo de velas que diminuísse nossa velocidade para chegarmos de manha, mas com ventos entre 25 e 35 nós, e mar alto e forte de popa, mesmo sem pano, já íamos mais rápido do que o plano de esperar pela manhã, então decidi entrar em Tobago assim mesmo. Tinha foto do Google do lugar, e as cartas pareciam conferir com as fotos. A umas duas milhas do porto, recolhi as velas, e fui no motor. Demorou mais porque tem uma corrente forte que passa pela plataforma marítima da ilha, e havíamos saído um pouco da rota quando fui dormir por 1 hora antes de aterrar e deixei a Lilian no comando, sem ter ensinado a ela que a corrente iria arrastar a gente de lado, que ela teria que ir compensando. Caímos uma milha e recuperei no motor.

Entramos pela boca da baia, muito bem sinalizada na carta Navionics, mas a luz encarnada não estava operacional, então me guiei pela luz verde e entrei sem problemas.

Com radar e carta ligados, percebi um obstáculo bem na frente da entrada do porto, já dentro da baia de Scarborough. Fui bem devagar até reconhecer a olho nu uma barcaça ancorada na entrada do porto.

Chamei a guarda costeira muitas vezes, conforme recomendado no livro do Jimmy Cornell, mas eles nunca responderam, então, na minha ultima transmissão, informei que estava entrando no porto e assim o fiz. Ancorei próximo a dois outros veleiros, mas ficamos um pouco para fora, pegando um swell de boreste que não deixou a gente dormir o que merecíamos depois dos últimos 4 dias navegando.

Joguei ancora as 01:30h e fomos dormir. Quando acordamos fomos fazer o diário de bordo, e anotamos 112 milhas nas 14:30h navegadas nesse quarto dia, o que nos deu uma media de 8 milhas/hora. Finalizamos nossa perna para Tobago no rumo 308° para compensar a corrente South Equatorial que passa por aqui.

Gastamos 100 litros, ou seja, a metade da nossa água, mais os 60 litros que trouxemos em garrafões, mais uns 60 litros que pegamos na mestra risada durante uma chuva, e 150 litros de diesel, também a metade dos nossos tanques, na vinda de Natal até Tobago.

Durante o dia, fomos fazer a papelada de entrada, e que confusão foi aquilo! Primeiro demos uma volta pela cidade e fizemos algumas compras, comendo no KFC na frente do porto. Depois fomos à emigração, que foi relativamente rápido, em comparação com o Sul Africano, capitão do Mojo, que conhecemos em Salut, Ele tinha esperado a noite fora para entrar de manha com luz. Esse agüenta mar pois estava com ondas altas e ventos fortes e eles ficaram na capa esperando para entrar. Também, ele é capitão de navio petroleiro e deve estar bem acostumado com mar grosso, navegando por onde navega. Ele ficou horas esperando na imigração!
Fiz logo amizade com o oficial da imigração, que nos deu uma certa atenção especial. Nessas horas acho que um pouco de relacionamento ajuda muito. Ser simpático é sempre melhor do que reclamão.

Depois fomos para o Customs e lá a coisa já foi um pouco diferente, mesmo sendo simpático! Muitíssimo complicado o sistema deles, e muitos cruzeiristas reclamando, pois a regra aqui é que você tem que registrar entrada e saída de cada área das ilhas e não do território delas. Chegamos quando o Sul Africano estava saindo, mas, porque o oficial não tinha o formulário certo, pois havia acabado e ele não tinha mais copias, ele foi passando outros na nossa frente. Não reclamei, mas fiquei em cima dele para ele não me esquecer! Aí ele foi fazer as copias e nos passou os formulários para preencher. Quando ele foi contabilizar o nosso custo, que deveria ser de $50TT (dólar Trinidad e Tobago, 6TTs para 1US$), ele adicionou mais 158,98TT e disse que era pela “hora extra” de termos chego de madrugada! Perguntei por que isso custava mais caro, se, quando chegamos de madrugada não fomos atendidos pela guarda costeira ou nenhuma outra autoridade da ilha. Ele disse que essa era a “regra”! Então, aconselho, só entrem nos portos de Trinidad e Tobago durante o dia, mesmo que tenham que esperar em capa lá fora.

O custo das coisas em Tobago e na ordem de 3x o do Brasil, então fomos “escolhendo” o que comprar para abastecer o barco até Curaçao. O porto não tem nenhuma estrutura para veleiros e cada um ancora onde pode. Existe uma torneira de água claríssima por trás de um prédio que parece ser uma fábrica de gelo e usamos a mangueira para trazer água até o cais onde enchemos nossos garrafões de água vazios e fomos fazendo viagens e enchendo nossos tanques de água do barco. Na saída, vamos deixar os tanques e os garrafões cheios. Antecipamos bom uso de água no trajeto até Curaçao pois vamos parando em todas as ilhas, que não tem recursos de água ou mantimentos. Minha filha vai estar a bordo, o que deve aumentar nosso consumo de água.

Consegui conectar via internet com o escritório pela primeira vez depois de Natal, fora as conexões por radio com a ajuda do Fernando, e fiz uma reunião por telefone com minha staff, que me ligaram para o internet café onde estava usando a internet ($10TT/hora). Tudo correndo bem por lá. Meu celular não aceitou o roaming local e estamos tentando solucionar esse problema. O radio tem sido nossa salvação e não fosse por ele, teríamos zero de comunicação com família, amigos e trabalho.

A Tatiana deve chegar a Trinidad no Sábado a noite, e vir para Tobago na madrugada do Domingo. Nossa intenção é fazer a papelada de saída na segunda-feira pela manhã e partir para o sul de Tobago em seguida. Depois passaremos por Los Testigos, La Blanquilha, Los Roques e Los Aves, antes de atracarmos na Marina em Curaçao. Lá, vamos fazer uma manutenção maior no barco, trocando as placas solares (32W) por placas mais potentes (130W) e adicionando um gerador de arrasto (14amp a 7 nós). Estamos também preparando um “grab bag”, a ser usado em caso de abandono do barco com itens que preparei durante os últimos livros consultados.

Um novo item a ser “revisado” pela total falta de qualidade na construção do barco é o suporte do piloto. Fui verificar o parafuso que segura o braço do piloto no quadrante, aquele que havia quebrado entre Noronha e Natal e aproveitei para dar uma vistoriada no sistema inteiro, e qual não foi a minha surpresa quando notei que os parafusos que prendem o piloto encostam no cabo de aço do leme! Se deixar vai cortar, e não tenho reserva para isso! Aí comecei a estudar o que fazer e o que pareceu mais óbvio foi cortar os parafusos. Segui nessa direção e desmontei o piloto. Aí a coisa ficou pior ainda, e tenho certeza de que os incompetentes que fizeram esse serviço tiveram suas orelhas vermelhas da xingação que se passou por aqui! Em primeiro lugar, de preguiça de ajustar melhor os parafusos da roldana do cabo de leme de bombordo, eles montaram a base do piloto de lado na plataforma de madeira que construíram para esse fim. Com isso, um dos parafusos ficou por cima da parede lateral da plataforma e não tinha como por a porca, então, vejam só a total falta de responsabilidade dessa turma, eles passaram um barbante no parafuso que não passava pela base da plataforma e empurraram ele para dentro do buraco, para “fingir” que havia um parafuso por lá! E não para por aí, como a plataforma que fizeram era menor que o espaço entre a parede de trás das cabines e uma parede construída para esse fim dentro do paiol de popa, que fica entre o casco e o deck, eles fizeram um calço com menos da metade do tamanho da lateral da plataforma, que nem alcança os parafusos que prendem a plataforma à parede estrutural, ou seja, algo que vai quebrar com certeza, e na pior hora possível não tivesse eu ido vistoriar essa área! Total irresponsabilidade e falta de segurança! Esses caras estão criando uma situação perigosa para leigos como eu, que se aventuram por águas desconhecidas em um barco com problemas desse tipo na construção. Fica aí minha sugestão para os próximos leigos a serem “lesados” por essa turma.

Quando chegar a Curaçao, vou mandar fazer um suporte de aço inox e substituir a plataforma de madeira que eles usaram, conforme estava na minha lista de pedidos de alterações para a ILS. Sim posso ir consertando essas grosserias encontradas no meu barco, mas fica a duvida, o que mais pode acontecer pela grosseria deles? Quando o barco bate em ondas fortes, pode quebrar ao meio? A quilha foi bem presa? O estaiamento não me preocupa tanto, pois, além de ser superdimensionado, foi feito pelo Gunter Weber e nele eu confio, mas e o resto? Que droga! Ninguém merece isso! Não a 250 milhas da costa, sem ninguém por perto, e com o risco de mais alguma coisa quebrar e afundar o barco em minutos!

De volta a Tobago, conforme previsto, a Tatiana chegou Sábado a noite em Trinidad e conseguiu o ultimo vôo para Tobago, chegando ao barco a meia noite. Estávamos já dormindo e acordamos com o barulho de um barco chegando ao nosso bordo e com a Tatiana chamando de dentro dele. Tinha mesmo o pressentimento de que ela chegaria no Sábado e, dito e feito, conseguiu até uma carona da Guarda Costeira de Tobago até o barco. Já não me sinto tão mal de ter pago o custo de overtime, pelo menos agora eles prestaram algum serviço que justifique esse custo extra.

Como no Domingo fica tudo fechado, fomos andar pela cidade, e comemos em um restaurante onde a comida era bem melhor do que a aparência externa. Na segunda-feira cedo, fomos tentar fazer a papelada de saída, mas, depois de algumas horas de espera, acabamos indo fazer compras e deixamos a papelada para depois do provisionamento do barco. Compramos tudo que precisávamos e chamamos um taxi para carregar até o porto, onde embarcamos no Matajusi. Depois das compras, conseguimos fazer a papelada, mas já tinha ficado tarde para sairmos, então esperamos para sair no dia seguinte.

Na próxima coluna reporto nossa viagem entre as ilhas da Venezuela até Curaçao.

Convido meus leitores a se comunicarem comigo pelo e-mail matajusi@gmail.com.

Se quiserem receber automaticamente informação sobre novas colunas online, registrem seu e-mail no FeedBlitz, pelo link, http://www.feedblitz.com/f/?Sub=449533

De Natal a Ilhas de Salut - Texto:

Natal a Illes Du Salut – A Partida!
(Fotos por Silvio Ramos, Lilian Monteiro, Nelson Matos Filho).

Passamos os meses de Outubro a Dezembro nos preparando para partir e posso dizer que não foi fácil. Estou escrevendo do barco ancorado em Ilê Royale, parte do arquipélago de Salut, na costa da Guiana Francesa. Nesse arquipélago fica a Ilha do Diabo, onde Papillon ficou preso e de onde conseguiu escapar em um saco de côcos. Paramos aqui para descansar pois tivemos dois dias de tempestades constantes e estamos muito cansados. Mas, sobrevivemos nossa primeira tempestade, e estamos aqui para contar mais essas aventuras no Matajusi.

Escrevo daqui, pois é a primeira oportunidade que tenho para escrever, porque a partida esta cheia de tarefas e quando se percebe, já estamos navegando, e não consigo escrever com o barco em movimento.

Para partir tivemos que cuidar de uma lista enorme de pendências, como testamento, transferência de patrimônio para meu filhos, documentação, vacinas, remédios, bancos, contas, credores, devedores, família, amigos, colegas de trabalho, entre outras muitas, mas uma importante foi a finalização da minha negociação com a empresa. Não foi bem como eu queria mas ficou de bom tamanho. Como já tinha guardado o dinheiro para a viajem, o que ficar no Brasil fica como patrimônio adicional ao invés de ter que cobrir nossas despesas de viajem e isso tira uma preocupação da cabeça.

O sentimento da saída é uma combinação de preocupações que precisam de uma dose forte de determinação para continuarmos em frente. Vamos passar por muitas situações, incluindo experiências positivas de vida, mas com os riscos inerentes em uma aventura desse porte. Minha preocupação com baleias diminuiu, depois desses primeiros oito dias em alto mar. Isso porque, quando o barco esta em movimento a noite, ele gera uma luz incrível de ardentia, micro organismos que brilham quando agitados, e isso vai avisar qualquer animal do mar, que estamos passando.

Natal:
Voamos para Natal no dia 09/01/09, e chegamos ao Iate Clube por volta do meio-dia. Fui direto para o barco, pois havia estado preocupado com os pequenos furtos comuns naquela área. O que achei me deixou tremendamente transtornado! Nenhum furto, mas o estado do barco depois de 3 meses era critico! Tudo enferrujado! O interior embolorado e enferrujado! Todas as torneiras cromadas, estavam enferrujadas! As capotas todas rasgadas! As velas desgastadas pelas capotas que foram soltando e não foram ajustadas pelo marinheiro contratado! Mergulhei e fui ver o casco, também, cheio de cracas e das grandes! Comecei a preparar para recolher as ancoras, pois as duas estavam bem firmes no fundo. Depois de algum trabalho e a ajuda dos marinheiros do clube, pois nada do meu marinheiro aparecer, consegui, mas elas tiveram que ser lavadas com jato de pressão, pois estavam completamente tomadas de algas e cracas.

Ai começamos a faxina, que não havia sido feita pelo Claudio. No dia seguinte, lá vem ele, que lógico, queria seu ordenado combinado de R$400,00/mês, o que de forma nenhuma eu estava disposto a pagar. Quando mostrei para ele o estrago que ele havia deixado causar no barco, a sua resposta foi, “mas o senhor só pediu para eu “olhar” o barco, e fiquei todos os dias “olhando” o barco lá de terra”!!! Tem cara que é folgado mesmo! Paguei menos da metade do combinado, mas mesmo assim com desgosto, pois a despesa que a falta de atenção dele me causou ficou muito mais caro do que isso. E não acabou por aí! O Claudio é capitão do barco Mar e Sub, que fica atracado no píer. Quando o Ilha do Mel saiu do píer e sobrou uma vaga, o Bosco, gerente do Iate Clube, sugeriu que eu pegasse aquela vaga para facilitar o embarque das provisões e manutenções que estava fazendo antes de sair para Tobago. Aceitei, só que a vaga era do lado do Mar e Sub. As 8:00h da manha do dia seguinte, quando o Mar e Sub estava saindo para um mergulho com passageiros, o Claudio pega as duas poitas e cordame sujos onde estava amarrado o Mar e Sub, e joga, não, atira contra o deck do Matajusi, fazendo um barulho enorme e sujando a capota e o deck, que tínhamos acabado de pagar um marinheiro (esse de verdade) para limpar!!! Peguei no radio e chamei o comandante do Mar e Sub, o Claudio, e disse que não tinha “entendido” a manobra das poitas, dele atirar as poitas no deck do meu barco. Ele respondeu que era a pratica do lugar!!! Eta cabra safado! Mas, parece que ele já esta meio que “pendurado” no clube, pois esta sempre “folgando” com os outros, fazendo marolas desnecessárias e sacudindo tudo por perto. Bom ,chega disso e vamos falar das coisas boas, mesmo porque, com certeza a sua própria atitude é seu maior inimigo.

Manutenções:
As capotas tiveram que ser consertadas (R$250) e eu mesmo consertei a vela mestra, que ficou com alguns furos do atrito das capotas que ficaram soltas por muito tempo. Além disso, minha maior preocupação com furtos no barco fica por conta dos instrumentos de navegação instalados na mesa do cockpit, então, mandei fazer uma peça de aço inox (R$700) que cobre os instrumentos quando eu não estiver por perto do barco. Uma outra alteração por conta de um buraco enorme que o barco tinha entre a tampa do paiol de ancora e o suporte da ancora, por onde entrava mais água do que tinha capacidade de vazão quando o barco caturrava muito e com isso tínhamos um vazamento para dentro do armário da cabine de proa, provavelmente pelos conduites, então mandei fazer uma adição à tampa (R$ 200) para cobrir esse buraco, mais um erro na construção do barco que tive que corrigir, além de tampar os conduites com sicaflex. Parece que isso resolveu o vazamento, pois com o mar que pegamos já teríamos visto algumas roupas molhadas.

Provisionamento:
Depois de tudo pronto no barco, fomos fazer o provisionamento, com uma carona do Nelson Matos Filho, cruzeirista atracado em Natal. O Nelson escreve uma coluna sobre o cruzeirismo para o jornal local. Ele e a Lucia, sua mulher, são super simpáticos e prestativos. Estão sempre a ajudar os cruzeiristas de passagem com caronas e ajuda com facilidades do local, que conhecem muito bem. A compra de supermercado foi grande (R$800), acho que a maior que já fiz, mas o barco estava vazio depois da subida da costa do Brasil. Não fizemos nada muito especial, pois era nossa primeira estocagem para uma perna mais longa, então fomos aprendendo pelo caminho e vendo o que funciona e o que não funciona. A próxima estocagem vai ser em Tobago pois aqui nas Ilhas Salut não tem supermercado. Tem sim um hotel e um restaurante, que espero conhecer amanhã quando desembarcarmos.

Primeira perna internacional:
Saímos de Natal por volta das 10h do dia 19/01 e logo fomos ganhando altura para passar o que chamo da curva do Brasil, mas é na verdade o Cabo Calcanhar. Minha rota previa singramento de 164 milhas diárias, ou seja, media de 7 nós, mas no primeiro dia só conseguimos 147 milhas, com media de 6.5 nós, e ventos Sueste entre 10 e 15 nós. Nesse primeiro dia usamos o motor por 7 horas para carregar as baterias. A primeira noite a bordo é sempre um problema pois estamos desacostumados com o balanço, mas depois vamos acostumando. No dia seguinte estávamos bem cansados, mas o caminho é longo e temos que persistir. Daqui que podemos admirar o tamanho do feito do Marçal Ceccon e outros como ele, que fizeram isso antes dos eletrônicos de hoje. Foram homens de coragem, que se sujeitaram a ficar muito tempo no mar, isso em tempos onde o conhecimento era mais precário e a informação quase inexistente.

Já no segundo dia, o calor era insuportável, assim quando vi uma chuva no radar, corri atrás dela, nos preparando para nosso primeiro banho de chuva, mas, cheguei um pouco atrasado e tomamos banho de água salgada mesmo. Com ventos Nordeste entre 15 e 25 nos, singramos 169 milhas nesse dia, e já pegamos o rumo 330° direto até Tobago. Isso nos leva a uma distancia da foz do Amazonas de 250 milhas, o que é bom para evitarmos troncos flutuando. O corpo todo dolorido de bater nos cantos, o que é comum nos primeiros dias de embarcado. Depois vamos evitando bater tanto. Nesse dia usamos 6,5 horas de motor para carregar baterias. Faltam só 1.484 milhas!

O terceiro dia nos viu 158 milhas mais próximo de Tobago, no rumo 343°, alterado um pouco para subir mais e evitar calmarias da zona de convergência. Motoramos um pouco durante as calmarias, usando o motor por 12 horas nesse dia. Com a ajuda do Igor do veleiro URUZ que chegou do Caribe com seu pai, o Alexandre Paraíba, aprendi a usar o radio SSB para baixar as previsões de tempo. Com isso consegui ver exatamente onde estava a zona de convergência e conseguimos passar sem qualquer problema, chegando a uma área onde os ventos aumentaram para 25 a 35 nós. Considerando o zig-zag, até que singramos bem esse dia. Durante a noite, finalmente pegamos chuva forte mas os ventos quase que acabaram.

Nosso quarto dia de viagem com ventos variando entre 5 e 35 nós, exigiu muito da gente, com os ajustes constantes das velas, mas conseguimos ganhar mais 139 milhas, agora no rumo 322°. Durante a noite, cruzamos pela primeira vez (na vela) a linha do Equador, mas perdemos a oportunidade de umas boas fotos pois dormíamos exaustos. Nesse dia, com a ajuda do Marcelo Richter, fizemos nossa primeira ligação pelo radio e falamos com o próprio Marcelo, para testar o phone patch que ele esta usando conectado ao radio, e ligamos para a mãe da Lilian. Eram umas 2:30h e ela pensou que era trote, mas fizemos a segunda ligação e ela reconheceu a voz da Lilian. Todos bem por la e por aqui. Tenho deixado o radio ligado a noite, em freqüência pré-combinada com o Marcelo e ele entra e chama a cada alguns dias. Outra ajuda que temos tido com rádios é do Fernando da Paraíba. Eu o apelidei de “Anjo da Comunicação”. Ele entra na freqüência quase todas as noites, e tem nos ajudado com recados de e para terra. Nossa rede de amigos do radio cresce a cada dia, e hoje inclui além do Marcelo e Fernando, o Américo, de Tocantins, e o Hugo de Salvador, com quem falamos freqüentemente. Alem desses, entram também o Doutor, o GG, o Boiadeiro, e outros mais. Nesse quarto dia tomamos pela primeira vez um banho de chuva, com direito a shampoo e sabonete, lavamos roupas e captamos a água que acumulava na saia da mestra risada, conseguindo transportar uns 8 baldes para os tanques de água. Preciso bolar algum método mais fácil de capturar a água da chuva. A comida tem estado muito boa, aos cuidados da Lilian.

No rumo 322° com ventos Leste entre 5 e 25 nós, com mar curto e picado, ondas de 2 a 4 metros, singramos 165 milhas no quinto dia, nossa melhor media (7.3). Temos variado entre 6 e 12 horas o uso do motor, que é usado principalmente para carregar baterias, mas nos dias de calmarias, ajuda a empurrar o barco para uma área com mais ventos. Nesse quinto dia, fazemos uma analise das comidas estocadas a bordo.

Na área de frutas, as maças são a grande vencedora, pois duram bastante tempo e são ótimas para manter o estomago sempre com algo para evitarmos marear. Os abacaxis e limões também sobrevivem bem, assim como as melancias e melões. Já as bananas, laranjas e mamões duram muito pouco e devem ser consumidos nos primeiros dias.

Quanto às verduras e legumes, alfaces duram muito pouco e a maior parte do que compramos foi perdida. Já a couve, mantida na geladeira, durou mais. Os tomates devem ser comprados verdes, pois amadurecem e ficam saborosos. Cenouras duram até uma semana, depois murcham, mas são ainda aproveitáveis. Os campeões são repolho, alho, cebolas e batatas.

As carnes e frangos, somente se mantidas bem congelados. Acabei comprando mais do que cabia no congelador e perdemos algumas. Peixes, somente para os dois primeiros dias, depois o negocio é mesmo pescar, a melhor forma de se obter peixe fresco a bordo. Um campeão são as latas de atum, que sempre podem suprir a área de proteínas e omega3. Salames são outra boa opção. Frios sobrevivem a primeira semana, mas compramos pouco (300g cada) e devíamos ter comprado mais, pois são ótimos para as refeições rápidas.

Alem desses itens, temos cupnoodles e miojos que misturados com ovos fazem uma boa refeição. Massas são sempre uma boa opção, mas nos primeiros oito dias só fizemos pasta uma vez.

Na área de bebidas, água tem sido a mais consumida, pois os sucos que a Lilian comprou dessa vez foram light, e para mim parece que o aspartame fica realçado quando estou embarcado. Já não bebo aspartame nem em terra, no mar fica impossível, pois o gosto me acompanha por dias, então fiquei pela água além de limonada fresca. Por conta da minha intolerância a lactose, eu bebo leite de soja e a Lilian bebe leite desnatado. Café da manha varia entre sanduíches, torradas com geléia ou patê de atum.

No sexto dia singramos 164 milhas no rumo 321°, com ventos Leste de 10 a 20 nós. Nesse dia tive que fazer manutenção nos parafusos do enrolador, que mesmo depois de fixados pelo Telles com sicaflex em Recife, soltaram novamente. Dessa vez não perdi nenhum, pois estou sempre de olho neles, e, depois de limpos, fixei com loctite. Vamos ver se seguram agora. Durante a noite, tivemos um pássaro como visitante, que além de não aceitar o pedaço de pão integral que, depois de uma semana, acho que nem os pássaros conseguem digerir, ainda deixou alguns presentes escrementados nas placas solares. Tive que vestir o colete e subir na targa com o barco em movimento para limpar a sujeira e melhorar a carga das baterias pelas placas solares. Nesse dia, armei a genoa junto com a trinqueta e funcionou bem. Só tive que ajustar a genoa algumas vezes, pois a intensidade do vento mudava com alguma freqüência. A mestra seguiu risada no segundo riso e a genoa alternada entre inteira, primeiro riso e segundo riso. A trinqueta permaneceu fixa.

Chegamos à metade na nossa perna, com somente 1/3 do diesel e 2/5 da água consumidos. Estamos considerando parar na Ilhas Salut da Guiana Francesa para conhecer o lugar. Isso nos tiraria da rota umas 80 milhas, a um custo de 11 horas mais um ganho de conhecer mais uma ilha pelo caminho.

Já o sétimo dia foi mais pesado, com uma tempestade como não havia passado a bordo antes, que me forçou a ficar acordado quase a noite toda. Ventos que passaram dos 35 nós, e ondas curtas e grossas, estourando, com altura entre 4 e 6 metros. Tive que mudar a rota para encarar as ondas, que passavam por cima do barco e fiquei a 35 graus do vento e das ondas pela maior parte da noite. Regulei as velas com uma pequena parte da genoa e a mestra no segundo riso, mas totalmente aberta para permitir ao vento passar. Regulei a velocidade para uns três a quatro nós e seguimos assim quase que toda a noite. Com a antena do SSB molhada não consegui capturar a previsão (estou capturando da estação de New Orleans, SSB 8.502.0, as 12:00h UTC) então não sabia o que tínhamos pela frente. Como a tempestade continuou pela manha, resolvi seguir com ela ao invés de contra, pois de dia conseguimos ver por onde andamos e podemos controlar o barco melhor nas maiores velocidades alcançadas quando vento e ondas entram pela aleta. Tenho usado o piloto em Response 1 para economizar bateria, mas nessa situação mudei para Response 3 que usa mais bateria mas corrige o barco mais rápido.

Com o cansaço decidimos pelo rumo 298° e aterrar para Illes Du Salut nas Guianas Francesas. Mais um dia para chegar lá, mas a quase certeza da oportunidade de descanso, pois não conhecemos o lugar e as cartas não são detalhadas.

Singramos 168 milhas nesse sétimo dia. Já no oitavo dia, a caminho das Ilês Du Salut, singramos 161 milhas com ventos nordeste entre 10 e 20 nós, mais uma forte corrente de três a quatro nós depois que alcançamos a plataforma marítima. Chegamos nas ilhas e ancoramos as 6:30h na cobertura da Ilê Royale, parte do arquipélago Salut. Notei que ultrapassamos o nosso recorde anterior de velocidade, que era 12.1 e passou a ser 13.8.
Dormimos o que tínhamos direito e levantei à tarde para fazer mais manutenções no barco. A correia do alternador Balmar estava cantando então ajustei corretamente. Também tirei 1 litro do óleo da rabeta, e repus com óleo novo, já que não tenho a ferramenta correta para tirar o óleo todo. Veio com o motor, mas a ILS não me passou esse item.

No por do sol, fomos agraciados pela visita de golfinhos com barriga cor de rosa. São menores dos que vimos frequentemente no Brasil.

Nosso anjo da comunicação, o Fernando, entrou na freqüência lá pelas 10 da noite e conversamos bastante. Depois ele fez um patch entre meus filhos e eu, ele usando o Skype para falar com meus filhos e transferindo para o radio pelo microfone, então consegui falar com os dois. A Tatiana esta vindo para Tobago e irá nos acompanhar até Curaçao, de onde retornara ao Brasil. Ela esta trazendo alguns itens de trabalho e peças reserva de radio. O Marcio recuperou bem da cirurgia que fez no nariz para acertar um desvio e tirar uma carne esponjosa que estava obstruindo sua respiração. Eu também operei disso nos EEUU, e foi um martírio! Ate hoje sinto ansiedade de ter ficado com o nariz entupido por mais de uma semana. Não deu outra, ele também sofreu a mesma coisa, mas agora já esta melhorando. Sugeri a ele para vir passar as férias de Julho comigo no Pacifico, mas ele já se comprometeu com umas ferias de sacolão na Europa com um amigo da faculdade, então vamos tentar para o final do ano na África.

Que maravilha poder compartilhar com meus filhos dessa aventura. Nada me faria mais feliz do que essa oportunidade de passarmos algum desse tempo juntos. Tenho até certa inveja quando vejo pais e filhos curtindo anos no barco juntos e acho essa experiência de valor imensurável, mas, cada um é cada um, faz-se o que se pode e isso é o melhor que podemos fazer nesse momento. Quem sabe se no futuro eu vou continuar com essa bala toda e eles vão ter mais tempo e oportunidade de virem curtir um pouco dessas aventuras comigo.

A Lilian construiu a bordo nossa primeira bandeira fabricada, a “Q” ou bandeira de quarentena. Ela é toda amarela e deve ser hasteada quando se entra em território estrangeiro. Isso sinaliza às autoridades locais e eles em geral vêm ao barco para fazer a papelada de entrada no país. Depois disso, é só manter a bandeira do país visitado no brandal de bombordo, com a bandeira do pais de origem no estai de popa. Dito e feito, a Gerdarmerie veio nos visitar e foram super corteses. Eles pediram documentação do barco, passaportes e visto de saída, quiseram ver o VHF funcionando, e completamos a papelada. Perguntei se podíamos ficar alguns dias, e eles responderam que podíamos ficar alguns meses! Informaram-nos que havia restaurante e hotel na Ilê Royale e vamos visitá-los hoje.

Com as preocupações e problemas inerentes nessas travessias, o espaço a bordo começou a ficar pequeno, e eu e a Lilian estamos nos desentendendo cada vez mais, então aproveitei hoje para fazer uma reavaliação com ela sobre nossas atribuições e responsabilidades no barco. Vamos ver se as coisas melhoram, pois vão ficar muito difícil desentendimentos em espaço de 12 x 4 por 12 meses.

Acabamos de voltar da visita a Ilê Royale. Lugar bonito, mas consigo sentir o sofrimento que se passou por la. As ruínas das celas e solitárias ainda mostram como deviam viver em sofrimento aqueles detentos que por la passaram e la ficaram. Os que morriam, eram jogados ao mar. Muito côco pelo caminho, mas todos comidos por algo. Achei logo que ia experimentar aqueles caranguejos do côco que o Marçal menciona no seu livro, mas, no fim, outra surpresa, a ilha esta forrada de cotias! Acho que são naturais, não sei, mas são muitas e estão por todo o lugar. Vimos também caimans, araras, lagartos, pavões, faisões, macacos, que vieram pedir parte da barrinha Nutry que eu estava comendo, tudo solto e livre. Esses não são naturais, mas vivem por lá naturalmente, soltos, as aves voando livremente. Bonito, mas ainda achei o lugar meio fúnebre.

Procuramos pelo Auberge du Ilê, e tentamos pegar um quarto, assim poderíamos lavar as roupas na pia ou melhor se tivesse uma banheira, mas o preço assustou. Pediram 235 Euros por dia para um simples quarto com cama de casal e banheiro, toda a comida incluída. Por um quarto mais simples, sem comida, pediam 70 Euros por dia. Assim decidimos em somente almoçar por la e voltarmos para dormir de graça mesmo no nosso barco. O almoço custou 29,10 Euros, mas a garçonete era brasileira e foi sugerindo a forma de pagar menos e comer mais! Depois do almoço fomos passear pela ilha, visitando a capela e as ruínas das celas. Por la conhecemos um casal de Sul Africanos com suas duas filhas. Ele é capitão de navios petroleiros e ficamos bastante tempo conversando sobre coisas do mar. Falei com ele sobre o AIS, e ele planeja instalar um no barco dele, pois como capitão de navio reconhece o valor da identificação pelo AIS. Ele fez uma sugestão que achei digna de se passar para a frente. Ele sugeriu que a melhor luz para se usar no mastro em alto mar, em rota de navios, é uma strobe, pois disse que é a luz que mais chama a atenção do piloto, pois se parece mais com redes que também tem strobes ligados, e em geral os pilotos desviam até 6 milhas dessas luzes. Sei que vai ter bronca do Macanudo, mas fica aí a dica.

Amanha partimos para Tobago.

Espero que o Igor e o Nelson Mattos tenham mandado as fotos da nossa partida de Natal, assim ficam todos informados que já saímos.

Convido meus leitores a se comunicarem comigo pelo e-mail matajusi@gmail.com.

Se quiserem receber automaticamente informação sobre novas colunas online, registrem seu e-mail no FeedBlitz, pelo link, http://www.feedblitz.com/f/?Sub=449533

De Noronha a Natal - Texto:

Noronha/Natal 2008
(Fotos por Silvio Ramos, Marcio - Bora Bora).

Fernando de Noronha:

Nos últimos dias em Fernando de Noronha o mar levantou, formando ondas mais altas que estouravam com força pela baia onde estávamos ancorados. Vimos fotos de swells assim onde as ondas passavam por cima da armação de pedra que protege o porto. Com isso, ficou impraticável novos mergulhos e passeios de botinho pela costa, então ficamos a maior parte do tempo em terra, caminhando e visitando mais lugares.

Acabamos não conseguindo receber as bolsas que o Cabanga ficou nos devendo, pois quando íamos buscar em terra, eles ou não tinham ou estavam fechados, e quando eles foram aos barcos deixar as bolsas para os barcos que não haviam recebido, esqueceram de deixar no Matajusi. Reclamei muito, com todo mundo que conseguia encontrar, e eles prometeram resolver isso depois da volta de Noronha. Como íamos para Natal, a única solução seria por correio, mas isso não aconteceu até a data de hoje. Não esqueci que não nos deram o que pagamos e não vou me esquecer. O Cabanga tem uma divida com a tripulação do Matajusi e de alguma forma eles vão ter que saldar essa divida, nem que seja com devolução de parte do valor das inscrições.

Inscrevemos-nos para a regata Noronha/Natal, e conversei muito com o pessoal do Iate Clube de Natal, principalmente sobre os pequenos roubos que tem acontecido por lá com os barcos visitantes. Prometeram uma poita bem próxima ao clube, principalmente porque o Matajusi vai ficar em Natal até nossa partida para Trinidad, que esta estimada para 12 de Janeiro de 2009.

A Regata:

No dia 4 pela manhã, foi dada a partida para a regata Noronha/Natal. Largamos no meio da flotilha, mas com boa velocidade, logo ficamos entre os 6 primeiros barcos. Alguns barcos apresentavam terem problemas com excesso de velas em relação ao vento, pois foram ficando mais para trás com as atravessadas. Um deles foi o Beneteau 47 que havia sido o fita azul na Recife/Noronha. Eles continuaram com dificuldades com o ajuste correto das velas até o anoitecer, quando já estavam a umas cinco milhas para trás, na nossa aleta de boreste. Ficamos surpresos no raiar o dia quando eles não estavam mais a vista, e achávamos que o havíamos deixado para trás. Ficamos mais surpresos ainda na nossa chegada em Natal, quando eles haviam sido novamente o fita azul. De alguma forma eles conseguiram ajustar suas velas e andar quase o dobro da velocidade do Matajusi, que diga-se de passagem, andou muito bem, com média de 7.8 nós.

O mar estava alto, dizem os locais que o mais alto nos últimos cinquenta anos! Oficialmente, falou-se em ondas de 4 metros, mas, em algumas ondas, quando o Matajusi com seus 12 metros estava no topo da onda, cabiam dois dele até a base da onda, ou seja, uns 20 metros. A metade de 20 sendo 10, tirando o exagero, acho que uns oito metros de onda ficaria correto de se estimar.

Algumas ondas quebravam perto do Matajusi, algumas em cima. Quando quebrava em cima era um tal de se esconder da aguaceira que vinha a bordo. Um delas quebrou no costado, com uma explosão enorme, jogando água na altura da metade do mastro, cobrindo a mestra com água, que ficou escorrendo para dentro do barco um bom tempo.

Mais ou menos nessa hora, quebrou o piloto automático. Eu estava no leme e percebi que o barco saiu do rumo. Vi uma mensagem no plotter algo a ver com o braço do piloto, o que pega no quadrante do leme e mantém o barco no rumo. Toquei sem piloto por umas duas horas, e chamei o Marcio para o turno dele. Enquanto ele tocava, desci para o sub-mundo, o lugar na popa entre o deck e o casco onde ficam as estruturas do leme e do piloto, e fui verificar a origem do problema.

Nessa hora reconheci que havia feito algumas modificações na estrutura do barco que valeram à pena, pois tinha mandado aumentar as janelas de acesso ao sub-mundo, assim como instalei uma lâmpada branca do tipo fria bem forte, justamente para o caso de ter que trabalhar no leme ou no piloto. Deitado na cama do camarote de popa de bombordo abri a janela, acendi a lâmpada e comecei a procurar pela causa do problema. Logo percebi que o braço do piloto estava caído de lado, fora do quadrante. Só podia ser uma quebra no parafuso que segura o braço ao quadrante, assim comecei a procurar pelos pedaços que haviam caído pelo casco. Isso não foi uma tarefa fácil, pois com o movimento do barco no mar alto que estava os vários pedaços dessa peça estavam espalhados pelo chão todo, debaixo de mangueiras e escondidos nos cantinhos de mais difícil acesso. Mas, com paciência e um pouco da minha sorte usual, encontrei todos os pedaços.

Percebi que o parafuso havia mesmo quebrado, e como não havia outro a bordo (agora tenho quatro, e vou trocar um a cada 1000 horas de uso!) tive que bolar um jeito de consertar aquele. Soldar não dava, então, cortar era a única solução. Mas, para cortar, tinha que cortar também a bucha que ficava na parte de cima do quadrante, segurando o braço na vertical. Com isso, a posição do braço ficou mais inclinada, mas o esforço no parafuso diminuiu. Com a ajuda da Lilian que me passava as ferramentas necessárias, cortei o parafuso, arrumei a rosca, cortei a bucha e estava pronto para testar se ia funcionar. Pedi ao Marcio para manter o barco o mais reto possível, sem mexer o leme, e fui para o sub-mundo de novo para instalar a peça restaurada.

Com um pouco de sorte, muito conhecimento do barco, bons conhecimentos de mecânica e muita concentração para não enjoar, depois de uns 20 minutos tinha consertado o piloto e pudemos contar com a ajuda dele para o resto da viagem.

No mais, continuamos com uma boa performance até a chegada a Natal, sempre muito próximos do Vmax2 e do PuraVida-RJ um Beneteau de 46 pés. Entramos no porto liderados pelo PuraVida, depois o Matajusi seguido pelo Vmax2. Só soubemos a noite, na entrega de prêmios, que havíamos conseguido o terceiro lugar na nossa categoria. Ganhamos nosso primeiro troféu, e nossa terceira medalha.

Estou muito satisfeito com os resultados que temos obtido em regatas, pois o Matajusi esta com mil quilos a mais do que seu peso normal, com todo o equipamento que instalamos a bordo, e mesmo assim, temos conseguido destaques como o quarto da regata de Caras de 2007, segundo no warm-up de Ilha Bela de 2007, segundo na regata Soamar de Vitoria de 2008, sexto na Refeno 2008, e terceiro na Noronha/Natal 2008. Só imagino se meu barco estivesse com seu peso normal....

Natal:

Chegamos a Natal no dia cinco perto do meio dia e fomos direto para o píer, lavar o barco e encher os tanques de água. Não é fácil essa vida de cruzeirista! Depois de mais de 24 horas navegando em mares bravos com ventos fortes, ajustando velas o tempo todo, com quase nenhum descanso, ainda chegamos a um porto e ao invés de irmos descansar, vamos lavar e arrumar o barco!

O Marcio e a Daniela tinham uma viagem para Caruaru de ônibus então ajudaram um pouco, mas logo foram procurar por condução para Caruaru. Depois soube que eles haviam conseguido um ônibus à noite e chegaram a Caruaru na manhã seguinte.

Admirável esse comprometimento dos dois de ajudarem famílias e crianças pobres!

Depois de amarrar o barco em uma poita, que para meu desconforto estava muito longe da frente do clube, tomamos um banho e nos arrumamos para participar da cerimônia de entrega dos prêmios. Ficamos surpresos e contentes com o terceiro lugar!

A festa proporcionada pelo Iate Clube de Natal foi bem melhor servida que a do Cabanga, com um preço por tripulante menor que 10% do que pagamos para participar da Refeno, algo a ser revisto pela organização da Refeno.

Nos próximos dias, preparamos o barco para hibernar em Natal até a nossa volta, que estimávamos para final de Novembro, mas agora sabemos que será em Janeiro de 2009, pois meus compromissos com a Harte-Hanks não me permitiram retornar mais cedo para o barco. Aliás, desde que comecei o projeto de volta ao mundo em um barco escritório, muitas coisas que na teoria deveriam funcionar, na prática não foram bem assim. Acho que para o interesse do nosso público, vou relatar um pouco dessa situação em uma próxima coluna.

Por sorte o Érico e a Renata, um casal muito simpático e prestativo que mora em Natal e estavam como tripulantes do Piatã, nos mostraram um pouco da cidade, nos levaram a alguns restaurantes típicos locais, além de nos ajudaram com lavanderia, casa de parafusos e ferramentas, e outras atividades afins.

Não deixamos de alugar um Buggy e fizemos o passeio completo das dunas, com todas as atividades criadas pelos nativos da região para entreter turistas. Incrível a criatividade desse povo local em utilizar as dunas características dessa região para montar atrações como tobogãs que deslizam na areia e caem em uma poça de água, ou o esquibunda, que consiste de cabos pendurados em uma duna alta, que passam por cima de um lago, onde os turistas descem por uma cadeira e batem com força a bunda na água. Depois eles são embarcados em uma jangada e levados para a borda da lagoa, onde sobem de volta ao alto da duna por um trenzinho improvisado com trilhos e um carrinho que é puxado por um motor velho de Kombi! Tudo isso sempre com as bancas de petiscos, vendendo entre outras iguarias, um espetinho de lagosta!

Esses passeios de buggy podem ser feitos com ou sem “emoção”!

Explico. Com emoção é quando o motorista faz manobras mais arriscadas como subir ou descer uma rampa inclinada em velocidade, ou fazer curvas com derrapagens, e coisas assim. Eu pessoalmente, como tenho experiência com corridas, fico mais atento a coisas do tipo, folga na direção, habilidade do motorista em controlar o carro em derrapagens, e nas duas vezes que fiz esse programa, achei pura sorte alguém não se machucar. Começamos pelo fato dos quatro tripulantes do Buggy não usarem cinto de segurança, o que pode ser até bom no caso de você ter que pular fora do buggy se ele começar a capotar, mas em outros casos, como em derrapagens, se você não estiver bem seguro, vai ficar para trás! Fico curioso em saber as estatísticas de acidentes com esses buggys. Recomendo alugar seu passeio, sem emoção!

Como tínhamos vôo para São Paulo no dia nove, passamos o dia oito finalizando o barco para deixá-lo em Natal. Contratamos o Claudio, um marinheiro do Iate Clube para cuidar do barco na nossa ausência, tiramos ele da poita que ficava muito longe da vista do clube e ancoramos bem em frente ao clube. Usei duas âncoras, uma Bruce de vinte quilos com uns quarenta metros de corrente, e uma Fortress com quinze metros de corrente mais uns trinta metros de cabo, armadas em V. Com um cabo menor, fiz uma cobertura do cabo da segunda âncora para que esse não desgastasse no atrito com o púlpito de proa. Cobri o barco com as lonas de proteção, e com o coração apertado, voltamos de avião para São Paulo.

Temos checado com o Claudio, marinheiro contratado em Natal, toda semana sobre o estado do barco, e, sabendo que dois barcos ancorados do lado do Matajusi já foram roubados, pedimos ajuda ao Érico para mudar a ancoragem do Matajusi para mais perto do píer do Iate Clube. São mesmo uma pena esses incidentes em Natal, pois isso desmotiva outros barcos de passarem ou ficarem por lá.

Preparando para sair:

Agora estamos nos preparando para sair do Brasil pela primeira vez, com planos de fazer Natal/Tobago em uma perna só. Serão 1.800 milhas náuticas, que na média de 7 nós, levaríamos entre 12 e 14 dias para alcançarmos Tobago, um dos portos de entrada de Trinidad & Tobago.

A lista é grande, entre documentos, remédios, check-ups médicos, propriedades, filhos, parentes e amigos, planos de viagem, mais equipamentos e reserva de equipamentos, material de abandono do barco em caso de naufrágio, roupas próprias em quantidades próprias, e assim vai.

Nosso plano é de voar de volta para Natal por perto do dia 10 de Janeiro, e passar os próximos dois dias preparando o barco para sair.

Depois da troca de óleo e filtros, revisão completa do motor e equipamentos, provisionamento, estamos prontos para largar âncora e partir para nossa aventura de volta ao mundo. A rota já tínhamos, então vamos seguir bem próximos da rota originalmente planejada, mas agora sem o compromisso de tempo. Saímos quando quisermos e chegamos quando chegarmos.

Com as experiências nas 3.500 milhas já navegadas, no Cruzeiro Costa Leste e nas regatas de Recife a Noronha e Noronha a Natal, aprendemos muito, e vamos usar nossa cada vez maior experiência e planejar viagens mais seguras e tranqüilas, quando o tempo permitir, saindo na maré certa e chegando na maré certa, aterrando de dia com o sol a pino ou por trás para facilitar a visibilidade do fundo, de preferência em flotilha e somente após planejar e plotar a perna inteira.

Vamos continuar escrevendo sobre nossas aventuras e experiências, e esperamos que nosso livro contado ao vivo, continue atraindo novos leitores e promovendo novos cruzeiristas.

As próximas colunas irão relatar essas experiências. Vamos tentar escrever a cada duas semanas, mas vamos depender de conexões em lugares mais remotos que ainda não conhecemos.

Convido meus leitores a se comunicarem comigo pelo e-mail matajusi@gmail.com.

Se quiserem receber automaticamente informação sobre novas colunas online, registrem seu e-mail no FeedBlitz, pelo link, http://www.feedblitz.com/f/?Sub=449533