sábado, março 14, 2009

De Tobago a Curacao - Texto:

Tobago a Curaçao
(Fotos por Silvio Ramos, Tatiana Ramos e Lilian Monteiro).

Tobago:
Saímos de Tobago as 8:30 horas e de cara pegamos ventos fortes e ondas altas e a Tatiana já começou a passar mal. Para piorar as coisas, esqueci de fechar a tampa do paiol de âncora, e ele encheu na primeira caturrada. Logo percebi a burrada e fui fechar no meio das caturradas fortes. Depois de algumas imersões junto com a proa, consegui fechar, mas, soubemos logo em seguida, que o estrago já estava feito, pois vazou muita água para dentro da cabine de proa. Cama, lençóis, travesseiros, velas, capas de velas, tudo ensopadinho. Está certo que eu não devia deixar a tampa aberta, mas a água não devia ter passagem para dentro do barco. Mais um serviço porco da turma da ILS! Enquanto a Lilian se pôs a retirar as coisas molhadas e secar a cabine, eu fui tocando o barco sozinho, com água passando por cima do convés.

Em um espaço de menos de 2 horas, a Tatiana vomitou umas cinco vezes, e fiquei muito preocupado com uma desidratação, então fiz uma parada não planejada na Milford Bay, a ponta sul da ilha de Tobago, onde aproveitamos para secar bem a cabine de proa.

Lembrei que tinha pedido para o estaleiro fazer um tanque de água doce na proa do barco, e que tinha ficado uma mangueira de lá até debaixo da pia da cozinha, onde era para ter uma bica de água doce, mas eles nunca finalizaram esse tanque. Aproveitei e conectei essa mangueira na bomba de porão para sugar a água de debaixo da cama. Havia impermeabilizado aquela área do barco exatamente para o caso de, se vazasse algo por lá, que não fosse para o resto do barco, pois lá fica o tanque de água negra do barco, e agora vi que a decisão tinha sido acertada, pois a água ficou retida debaixo da cama.

Ficamos umas duas horas parados por lá, para que o Dramin que demos a Tatiana fizesse efeito, aí seguimos para Los Testigos.

Algumas horas depois, a Tatiana continuava vomitando a cada meia hora, então propus que fossemos para Trinidad e que ela abortasse a viagem, pois estava muito impressionada com o tamanho do mar e com as histórias de piratas que havia ouvido. Ela concordou, e foi o que faltava para ela pegar no sono, na cama que montamos no centro do barco. Fomos medicando-a a cada quatro horas, e quando acordou, já estávamos ancorados em Los Testigos! Foi uma mentirinha, mas funcionou!

Durante a viagem, deixamos duas gaiutas abertas do lado de sota, uma na sala e uma na cozinha, pois a Tatiana estava dormindo na sala, e em uma das ondas altas, o barco deslizou pela onda e deu de lado no fundo da onda, e encheu a sala e a cozinha de água salgada. Eu sei, eu sei, não andar com gaiutas abertas, mas, parecia que pela sota não tinha problema, até que teve. A Lilian estava possessa de ter que enxugar o barco de novo, mas faz parte da aventura.

Los Testigos:

Chegamos em Los Testigos pelo Norte, mas ainda sem luz do dia, então diminuí a velocidade para procurarmos um lugar para ancorar já com luz. Após 22 horas navegando, ancoramos na primeira enseada abrigada, depois da praia dupla, com mar dos dois lados. Singramos 141 milhas pelo rumo 288°, com ventos nordeste entre 20 e 25 nós e média de 8.1 nós.

Logo que joguei a âncora, o Insouciance, um barco com bandeira brasileira veio ancorar do nosso lado. Ele havia chego à noite e ancorado em frente à praia, mas tinha escolhido um lugar com muita corrente e ficou desconfortável, então, levantou âncora para ancorar do nosso lado. Falamos um pouco e fui dormir. Lembro que ele me disse qualquer coisa sobre ter sido atacado por piratas, mas estava cansado e resolvi checar a história depois que dormisse um pouco.

Quando acordamos, soube pela Tatiana que a guarda costeira tinha vindo pedir a documentação do barco, mas disseram que voltariam à tarde. Foi aí que ela soube que não estava em Trinidad, mas sim em Los Testigos! Ficou um pouco preocupada, mas com todas as nossas aventuras pela ilha, logo esqueceu.

A ilha me surpreendeu pela simpatia dos moradores e da guarda costeira. Logo pela manhã, fomos à praia para andar e exercitar um pouco, e conhecemos o Felix, filho do JonJon (ou algo parecido), um dos membros da família que povoou a ilha a muitos anos atrás. Foi amizade a primeira vista! Falamos de mergulhos e pescarias e ele logo me convidou para ir dar um mergulho para pescar lagostas. Voltei para o barco e peguei meu equipamento de mergulho. Ele veio me buscar com seu barco, e trouxe somente uma máscara, um pé de pato, e um laço, parecido com aqueles de pegar cobras. Fomos mergulhar em um dos lugares de lagostas e ele pegou uma com seu laço, logo no primeiro mergulho! Fiquei ajudando a procurar lagostas e logo vi uma, que apontei para ele. Fiquei observando como funcionava aquilo. Ele enfia o laço por trás da lagosta, sem tocar nela. Quando ela sente o laço, ela chicoteia para trás, e é quando ela própria se enlaça! Pegamos 3 em pouco tempo e voltamos ao Matajusi.

Enquanto preparava as lagostas, o Felix foi fazer algo, mas voltou mais tarde para nos levar até o posto da guarda costeira para fazer a documentação do barco. Lá, fui atendido pelo Sargento Jaques, que me tratou muito cordialmente. Depois o Felix me disse que dava cabras, peixes e lagostas para alguns deles para mantê-los amigos! De lá, o Felix nos levou para as dunas e para a praia das tartarugas, onde elas botam os ovos, mas saímos logo, pois ele disse que o lugar tem fantasmas! À noite, ele veio para o Matajusi com seu violão de quatro cordas, parecido com um cavaquinho e ficamos até tarde tocando e cantando. Ele cantou muitas músicas, a Tatiana cantou algumas e eu toquei flauta o tempo todo. Que delícia! Era tudo que eu sonhava fazer nessa viagem! Depois que se foi, combinamos um mergulho para o dia seguinte, e eu fui fazer um laço igual ao dele para experimentar.

Resolvi ficar mais alguns dias por Los Testigos, e no dia seguinte fomos mergulhar de novo. Dessa vez em um lugar mais aberto, com ondas altas estourando sobre a gente. Só vi uma lagosta e estava muito para dentro de um coral, então voltei pagão, contra as oito que o Felix pegou! Acho que ele sentiu pena de mim, pois me levou para um lugar mais calmo e ficou esperando enquanto eu pegava minha primeira lagosta no laço.

No final da tarde, ancorei o Matajusi do lado do Insouciance, o barco dos brasileiros, para fazer-lhes uma visita, tripulantes de outros 3 barcos resolveram fazer o mesmo, o que virou um luau e dos bons, com vinho, cerveja, sopa quentinha feita pela Cristina e muita música, pois o Felix apareceu mais tarde com seus violões, cantamos e tocamos muito. Aproveitei para saber um pouco mais do que tinha acontecido com eles, e soube que eles haviam sido assaltados por piratas na Laguna Grande há alguns dias atrás, e que os bandidos haviam dado quatro tiros no Bob, e nenhum acertou. Eles me mostraram os furos das balas, uma no encosto do sofá da sala, e outro no teto do cockpit. O Bob disse que saiu xingando os bandidos no meio dos tiros, que achou que eram de estopim, e que tinham cinco bandidos envolvidos: dois no seu botinho, tentando cortar os cabos e cadeados; dois no cockpit, com um já dentro da sala; e um no barco de espera. Ele teve muita sorte dessa vez! A Cristina tem 50 anos e é terapeuta. O Bob tem 60 e é empresário. Eles mantêm um blog do barco deles (http://www.velejandocomavida.blogspot.com/) e devem postar mais detalhes sobre esse assalto que sofreram, além de fotos do nosso luau.

No final do luau, nos despedimos e fomos dormir, pois a idéia era sair as 6 da manhã, mas acabamos acordando mais tarde e assim deu tempo do Felix vir se despedir da gente.

Na saída, deu alguma pane no piloto, que não queria engajar e dava a mensagem NO RUD REF, o que acreditava ser, sem referência do leme. Desci para o submundo, fucei em tudo e não vi nada errado. Desliguei os equipamentos e comecei a fazer duas voltas de dois minutos cada, ligando os equipamentos de novo logo após o início das voltas. Segundo o William da Marine Express, isso sinaliza ao sistema para resetar. Não sei se foi isso que acertou o que estava errado, mas o piloto voltou a funcionar.

La Blanquilha:

Partimos para La Blanquilha às 9:50 horas e chegamos na vila dos militares de La Blanquilha às 22:30 horas, singrando 96 milhas numa media de 7 nós, com ventos nordeste entre 8 e 15 nós e ondas entre 1 e 3 metros. Como já era noite e o radar desmentia o que a carta dizia, resolvi ancorar na praia dos dois coqueiros no final da ilha. Eram 23:30 quando finalmente ancorei entre os dois veleiros que lá estavam.

Acordamos no dia seguinte com o rinchar dos burros selvagens que por lá abundam. Preparei o botinho para a Tatiana e a Lilian irem à praia a remo e eu fui a nado para me exercitar um pouco. Passamos o dia explorando o lugar. Atrás dos dois coqueiros existe uma laguna, que estava seca, e caminhamos por ela até o fim, quando demos em um túmulo com muitas oferendas, e algumas recentes. Fotografamos o lugar e continuamos a explorar, encontrando lagartos, iguanas, e pássaros, alguns conhecidos e outros não. Enquanto a Lilian e a Tati caminhavam pela praia, fui fazer um mergulho nos corais logo em frente, e vi um dos peixes mais bonitos que jamais tinha visto! Era um tipo de frade, mas de múltiplos tons de lilás. Vi também um olhête de bom tamanho e fiquei brincando de esconde-esconde com ele por um bom tempo. Eu chegava mais perto, ele se escondia, eu o achava e ele saia para se esconder de novo. No caminho de volta para o barco, dei com uma barracuda das grandes bem em baixo do barco. Fui descansar um pouco, pois íamos passar a noite velejando para Los Roques.

Los Roques:

As 16:00 horas levantei, preparamos o barco para a velejada e partimos. Seguimos com ventos entre 8 e 28 nós e mar calmo, pelo rumo 289°, pelas primeiras 84 milhas das 115 que tínhamos que percorrer, para nos desviarmos de La Orquija, uma ilha militar com acesso restrito. Depois seguimos pelo rumo 260° pelas próximas 34 milhas, até a entrada da passagem interna entre os corais e baixios de Los Roques. Com ventos fracos e mar calmo, seguimos entre 6 e 7 nós, e eu aproveitei para dormir um pouco, pois eram perto das 9 horas e meu turno tinha começado às 4 horas da manhã.

O barco estava com todo o pano em cima, e acordei com umas gotas na cara. Olhei para trás e não gostei do que vi! Vinha uma chuva forte com carneirinhos já bem próximos de nós. Pulei para começar a reduzir velas, mas já era tarde. O vento e a chuva nos pegaram e demos uma atravessada das boas. Completei a atravessada na mão, e fui de cara para o vento, assim pudemos baixar a mestra e ajustar a genoa. Voltei nossa rota, mas agora já com a arrebentação bem próxima. Os restos de um navio lembram os danos que erros podem causar.

Com a chuva grossa e sem visibilidade, segurei um pouco fora da entrada, e foi o bastante para perceber que a carta estava MUITO errada, pois onde dizia que estaria o farol com a entrada, era pura arrebentação. Fui descendo a costa devagar, até achar o que parecia ser a entrada, e percebi um catamarã ancorado do lado de dentro. Fui devagarzinho procurando pela área mais funda e entrei. Ancorei do lado do catamarã e o chamei no rádio. Ele me disse que tinha ancorado para esperar passar a chuva grossa e ter melhor visibilidade, pois a sua carta também estava muito fora.

Assim que completei a manobra de ancoragem e entrei no barco, percebi o catamarã saindo com um cara no mastro, de pé na cruzeta. Sai correndo de novo e fui levantar ancora para seguir o cara, pois o que eu tinha como referência não batia com o que eu via. Tinha uma foto do guia da Venezuela, dado pelo Bob do Insouciance, e a rota que o catamarã estava seguindo não parecia a correta, então, segui pela rota que achava ser a correta e ... não deu outra, eles estavam na rota certa e eu, em um lugar que não batia com as cartas, então eu não sabia se dava para prosseguir por lá, ou se devia voltar e dar a volta por onde o catamarã tinha prosseguido. Resolvi seguir em frente, mas sempre lembrando das palavras do Marçal Ceccon, se não fizer a coisa certa, mais cedo ou mais tarde vai acabar pagando por isso. Pedi para a Tatiana ir à proa apontando possíveis recifes, e fui dirigindo o barco pelas áreas mais profundas daquele canal. Por sorte, lá na frente tinha uma saída para o canal principal, que peguei e segui até a cidade de Los Roques na ilha de Gran Roque, com umas montanhas de pedra altas e um farol novo e um velho lá em cima.

Ancorei na faixa dos 3 metros, na frente da cidade e nos preparamos para ir de bote conhecer o lugar. Los Roques tem agora uns 1500 habitantes, e está repleto de pousadas, um aspecto bem diferente do que o Marçal deve ter visto quando por aqui passou. Escolhemos o restaurante El Canto de Las Ballenas para jantar, ao preço de US$45 por cabeça, meio carinho, mas conhecido como o melhor restaurante de Gran Roque, o que é verdade; vamos comemorar a vinda da Tatiana ao barco. Fomos muito bem servidos, e conversamos muito com a Nelly, dona do restaurante, e com seu filho Arjuna, que me deu umas dicas de mergulho pelo local. A Nelly se propôs a nos ensinar a fazer pães na manhã seguinte, e quando ela soube que a Tatiana era cantora/compositora e que tinha CDs gravados, nos convidou para tomar café da manhã de graça em troca de um CD, o que aceitamos com prazer.
De manhã, acordamos com um barulho enorme de pássaros e muito movimento na água. Sai para ver e fiquei impressionado com o número de gaivotas e pelicanos mergulhando em volta do barco. Me lembrou do filme “Pássaros”! Também vi um cardume enorme de peixes de bom tamanho, acima de 30 cm, mariscando a tona d’ água. Os peixes traziam os cardumes de pequenos peixes para a tona para cercá-los, e os pássaros mergulhavam para pegar a sua parte.

Novo lugar, novas amizades relâmpago, e ficamos muito amigos do pessoal da pousada da Nelly. Depois de um bom papo, ela nos convidou para um arroz marisqueira que iam fazer, e acabamos ficando o dia todo por lá, aproveitando para usar a internet pela rede sem fio que eles tinham. Depois do café, elogiamos o pão caseiro e logo a Nelly nos convidou para fazer alguns pães. Passamos a manhã fazendo pães!

Comprei um guia dos peixes de Los Roques, um trabalho magnífico feito por uns locais, que é vendido por 45 bolívares (5 bolivars = 1 US$) no Imparques. Tinha visto o livro em uma loja, e estava pagando 120 bolivares por ele, mas como era o ultimo, o cara não pode vender. Acabei economizando 75 bolivares!

Depois do arroz marisqueira, que era um tipo de risoto de frutos do mar que incluía lagosta, ovas de peixe, peixe, mariscos, e pelo menos dois tipos de caramujos locais, fomos escalar a montanha rochosa atrás da cidade e visitar o farol antigo. A Tatiana estava adorando o arroz, até o Arjuna dizer que tinha caramujos! Ela repetiu, Snails? Eu confirmei, e foi a última garfada dela! Mas, estava delicioso! Subimos a montanha e visitamos o farol antigo, já em estado de ruínas, com o interior todo desabado. Voltamos à pousada para nos despedirmos e fomos para o barco, para zarpar na manhã seguinte e conhecer Carenero, onde vive o Paím, um pescador local que eu queria conhecer. Ventou muito forte durante a noite, e de manha, quando saímos, o vento continuava forte. Decidi ir por fora para Carenero, mas a coisa apertou e entrei por uma área que havia estudado pelo Google, onde parecia ter uma baiazinha bem segura. Achei a baia e entrei devagar, mas a profundidade nunca ficou menor do que 2 metros abaixo da quilha. Ancorei na ancoragem mais linda onde já vi o Matajusi, um lugar pequeno e lindo, lotado de conchas, com peixes pulando e pássaros mergulhando por todos os lados, e logo fui dar uma mergulhada. Voltei em pouco tempo com duas sororocas e um olhete de bom tamanho, o que não demorou muito para virar um bom e repleto sashimi a bordo. Com os ossos e cabeças, fiz um pirão para reforçar o almoço. Ficou uma delicia!

Fui mergulhar com a Lilian para mostrar o lugar que eu tinha ido pescar, pois era completamente repleto de todos os tipos de peixes. Ficamos por ali uma meia hora, e tiramos fotos submarinas com a câmera que minha filha me trouxe de presente. É uma Olimpus 1030W, a prova d’água (10m) e contra choque. Encontrei uma lagosta e tirei umas fotos, mas deixei ela por lá. Na volta para o botinho, vi uma vieira das pedras, uma concha saborosíssima que poucos conhecem, então peguei e fui procurar outras. Acabei encontrando umas seis delas e levei para o barco para comermos crua.


Dormimos meio cobertos do vento forte pela vegetação da ilha, e acordamos às 8 horas para sair para Las Aves às 9 horas. Teríamos umas nove horas de navegação para chegar a Las Aves de Sota ainda com luz do dia, para possibilitar uma ancoragem segura, mas acabamos indo mais rápido, com ventos entre 10 e 25 nós, vindos de popa e todo pano em cima, com genoa armada em asa de pombo.

Las Aves:

Percorremos as quase 60 milhas em 7 horas e meia, chegando a Las Aves de Sota as 17:30 horas. Na passagem pela Las Aves de Barla, para meu desconforto, um pesqueiro ficou mais perto da gente do que precisava, fazendo manobras sem nexo na nossa proa. Ele mostrou que andava mais que o Matajusi. Assim, decidi pegar vento de través e cruzar para o norte, entrando na ilha de sota pelo norte. Rapidinho estávamos lá e escolhi a segunda ilha para ancorar junto com dois outros veleiros que por ali já estavam. Ancorei em 3,5 metros de profundidade e dei uns 30 metros de corrente para evitar os solavancos, e funcionou relativamente bem. Acordamos com chuva, mas fomos assim mesmo para a praia de botinho. As ondas estouravam forte na praia e procurei o melhor lugar para desembarcarmos. Achei um na ponta sul da ilha e logo carregamos o bote para cima da duna de areia. Percorremos a ilha inteira pela costa, e vimos muitas conchas daquelas grandes. Todas tem um furo no mesmo lugar, acredito que quem ou o que faça esses furos tem a manha de cortar a lesma pelo lado de dentro para poder soltá-la e comê-la, mas deve ser algo com dentes muito fortes, ou algum tipo de ácido que dissolva a concha. Vimos milhares dessas conchas, mas somente uma viva. Pelo menos sabemos que restou uma!

Como tínhamos que estar em Curaçao no dia seguinte, pois a Tatiana voa as 15:30 de volta para os EEUU, saímos as 19:00 do dia 20 de Fevereiro para Curaçao. Com ventos diretos de popa, sai da área de ancoragem e fui para uma área mais funda para girar o barco de frente para o vento e levantar a mestra. Quando fizemos isso, e virei de novo o barco para o vento, prestei atenção em outras coisa e deixei o barco girar virar demais, provocando um jibe da mestra. Por uma infeliz coincidência, no mesmo segundo que eu fui voltar a vela para bombordo, a Lilian foi tentar ajustar a escôta da mestra, mas por baixo da linha que a escôta faz quando a vela vira de lado, então, com o jibe de retorno da vela, a escôta pegou na cabeça dela, empurrando ela contra a parede lateral do cockpit, e, bela cacetada com a boca no cockpit! Não chegou a abrir, mas seu lábio ficou bem roxo e com sangue pisado. Até agora, não parece que nenhum dente foi afetado pela batida, mas vamos ficar de olho. A velejada até Curaçao estava estimada em 11:30 com pouca vela e media de 6,30 nós, mas, mesmo sem genoa e com mestra risada no segundo riso e ainda fechada para o vento, andávamos a mais de sete nós. Passamos por Bonaire toda iluminada a noite, e seguimos para Curaçao.

Tinha posto um anel de proteção ao barco no radar, e acordei quando o alarme tocou. Olhei e achei que tinha chuva pela frente a bombordo, mas mesmo assim fui conferir a carta, e, surpresa! Tinha uma ilha no caminho! Como pode acontecer isso? Eu tinha conferido essa rotas muitas vezes. O que aconteceu é que, juntei a rota de Aves a Bonaire com a de Bonaire a Curaçao, pois não tínhamos tempo de parar em Bonaire, e tive que deletar alguns waypoints, mas não conferi no detalhe em zoom a rota editada, e, dito e feito, não vi uma ilha no caminho!

Depois da ilha, que a Lilian pensou ser uma rede, apontei o barco para o farol da ponta de Curaçao, e por lá seguimos. Assim que dobrei a ponta, vi algo no radar, mas nenhuma luz que fosse com aquilo. Fiquei de olho, e reconheci que era algo em movimento, mas sem luzes de navegação. Consegui distinguir algo se aproximando a olho nu, e a mancha foi crescendo no radar. Quando ficamos de través, liguei um holofote forte que tenho e apontei para aquilo, que logo reconheci como um navio de guerra! Eles responderam com um holofote mais forte do que o meu, e dei dois sinais de luz, querendo dizer, OK, entendi, não ilumine um navio de guerra! Diminui um pouco a velocidade para chegar à entrada do porto com luz do dia, e quando o dia chegou, fui entrando entre Panda e Outrabanda, as duas zonas da cidade de Williamstadt separadas por esse canal de água. Logo na entrada tem uma ponte de pedestres, e chamei pelo radio a Bridge Control para ter uma idéia de quando eles iam abrir a ponte. Eles responderam que entre quinze e vinte minutos, e esperamos por ali, já dentro do canal e próximos a ponte. Em menos do que quinze minutos, eles começaram a abrir a ponte, que abre de lado! Eles navegam com um lado da ponte canal a dentro, com o outro lado preso, então vão entortando a ponte para abrir um espaço e deixar os barcos entrarem.

Bom, chegamos a Curaçao. Navegamos a motor canal a dentro, e não paramos na imigração ou customs. Fomos direto para a Curaçao Marine. Ainda bem que encontrei um velejador suíço com sua esposa em Los Aves de Sota e ele me deu algumas dicas da chegada até a marina, pois tem uns lugares muito rasos que não estão nas cartas.

Chegamos à marina, atracamos o barco e fomos conhecer o lugar. Logo encontramos o Julio, que esta reformando o barco por lá, que nos deu muitas dicas sobre o lugar. Ele disse que tínhamos que voltar para o canal e fazer a imigração e customs. Então pegamos o botinho e fomos de botinho. Com o vento forte, e um botinho que realmente não foi feito para essas aventuras, nos molhamos bastante e, quando chegamos ao lugar que o Julio tinha nos dado, o píer era alto e estava lotado de óleo por todos os lados! Foi um trabalhão desembarcar a Tatiana e a Lilian sem se sujarem de óleo! Mas, consegui, achamos a imigração, fizemos os papeis, tudo muito simples e cordial, e fomos para o Customs, do outro lado do canal. Lá puxamos o botinho para cima da calçada da cidade, imaginem a cena, com todos olhando! E isso, do lado do Nirvana, um super yacth espanhol de mais de 100 pés. Bom, fizemos Customs, sem problemas e voltei ao barco de botinho, mandando a Tati e a Lilian de táxi (US$15).

A Tati preparou as malas, e fomos para o aeroporto. Depois de uma fila enorme, ela embarcou, e um pedaço de mim foi junto com ela. Foi ótima a estada dela no barco. E até que ela e a Lilian não se pegaram muitas vezes! Mas adorei tê-la a bordo, e ela gostou muito também, então, vamos esperar por mais oportunidades dela se juntar a nós pelo caminho.

Na próxima coluna vou relatar mais da nossa vida em Curaçao.

Convido meus leitores a se comunicarem comigo pelo e-mail matajusi@gmail.com.

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